Baixar - Brasiliana USP
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56 MYSTERIO DA TIJUCA<br />
XXII<br />
TEMPORAL AO SBCCO<br />
Quando Leão Vermelho partio para<br />
o Brazil, seu filhinho Gregorio tinha<br />
apenas dous annos de nascido.<br />
Tubarão, que ouvira aquella criança<br />
balbuciar os primeiros vagidos, foi<br />
de tal fôrma lhe tomando amizade,<br />
que acabou por fazer d'ella toda a sua<br />
preoccupação e todo o seu enlevo.<br />
Passava horas esquecidas com o pequenino<br />
no collo, a conversar, a fallar<br />
em linguagem de criança, a suspendel-o<br />
no ar e a metter-lhe o dedo na<br />
bocca e nas covinhas das pernas.<br />
O bebê desfazia-se em risadas com<br />
o marinheiro, epuxáva-lhe as barbas,<br />
na graciosa irracionalidade dos dous<br />
annos. Tubarão babava-se, a rir e a<br />
chorar de ternura.<br />
E quando o amo chegou a partir,<br />
já o pobre homem estava preso aquella<br />
gente por uma amizade sem limites,<br />
cuja transparência só as palavras do<br />
commandante, segredadas á bordo,<br />
embaçavam sob maneira.<br />
Todavia era forçoso obedecer. O<br />
marinheiro principiou então a seguir<br />
os passos de Cecília, sem perder de<br />
vista todos os seus movimentos. O<br />
menor incidente da physionomia, a<br />
mais leve alteração de humor, tudo<br />
o marujo observava com cuidado e<br />
reserva.<br />
Umdiaachou-a summamente triste<br />
e concentrada. A' mesa não dera uma<br />
palavra e á noite, depois de passar<br />
longas horas fechada no quarto, appareceu<br />
com os olhos inchados e vermelhos.<br />
O próprio filho n'esse dia<br />
não conseguio distrahil-a; ella, ao<br />
contrario parecia não poder suppor-<br />
tar os seus gritos e as suas travessuras.<br />
— Vocemecê sente alguma cousa,<br />
D. Cecília? Perguntou-lhe o Tubarão,<br />
quando a pilhou de geito.<br />
— Estou nervosa! Respondeu ella,<br />
affectando despreoccupação.<br />
— Hão de ser as saudades do<br />
capitão !... Aventou o marinheiro,<br />
torcendo nas mãos o seu pesado<br />
gorro de baeta azul.<br />
Aquella observação perturbara sobre<br />
maneira a rapariga e trouxera-lhe ás<br />
faces um leve côr de rosa.<br />
— Ha seis mezes que elle se foi...<br />
Accrescentou Tubarão, com os olhos<br />
baixos e o semblante entristecido —<br />
seis mezes?! Quasi sete. Ora esperei<br />
E depois de contar os mezes pelos<br />
dedos — E' isso, são seis mezes e<br />
dezoito dias.<br />
— Deve ser isso mesmo ! Disse<br />
Cecília, quasi com impaciência.<br />
E os dous calaram-se, sem encontrar<br />
mais nada para dizer,<br />
— Vocemecê precisa de mim para<br />
alguma cousa?<br />
— Não. Podes te recolher quando<br />
quizeres. Não preciso de companhia.<br />
O marinheiro afastou-se, sacudindo<br />
os hombros, e foi para o seu quarto.<br />
Mas não pôde conciliar o somno:<br />
a preoccupação estranha da patroa e<br />
as recommendações do commandante<br />
tiravam-lhe o socego do espirito —<br />
Não 1 Dizia elle de si para si.— Não I<br />
não é possível ! Além d'isso, com<br />
quem ? I Aqui só vem o velho capitão<br />
Rego e outros tão inoffensivoscomo<br />
este ! Ella pouco sae !... Onde, por<br />
conseguinte, poderia apanhar uma<br />
relação que autorisasse as palavras<br />
do commandante ? ! Não ! definitivamente<br />
! o que ella tem são saudades<br />
do marido I Nem podia ser de outro