Baixar - Brasiliana USP
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]56 MYSTERIO DA TIJUCA<br />
em sua presença, se o senhor não<br />
me quizer perdoar.<br />
O commendador sacudiu os hombros.<br />
— Do que me pôde servir a vida,<br />
continuou Portella—se tenho de representar<br />
o papel de um criminoso,<br />
um homem máo e corrompido?<br />
Entretanto, juro-lhe, commendador.<br />
que tudo o que acaba de succeder<br />
não foi, nem uma conseqüência da<br />
perversidade, de meu caracter, nem<br />
tão pouco da baixeza de meus sentitimentos.<br />
A mocidade tem seus escolhos,<br />
o amor tem seus despotismos!<br />
Sei que procedi como um infame,<br />
mas sei igualmente que não<br />
poderia proceder de outro modo. Na<br />
situação em que me collocou a fatalidade<br />
d'esta desgraça, eu não tinha<br />
outro caminho a seguir! Fui<br />
talvez máo e deshumano, juro-lhe<br />
porém que não o fui por calculo e<br />
premeditação. Para cumprir o meu<br />
destino precisei abafar todas as vozes<br />
que me arguiam de dentro, precisei<br />
amargar todas as lagrimas, que me<br />
saltavam dos olhos. Quantas vezes<br />
não invejei o seu destino, e não amaldiçoei<br />
esse amor insensato, que me<br />
fazia esquecer tudo o que eu devia á<br />
sua generosidade e á sua philantropia!<br />
Oh! Soffri! Soffri muito! Para<br />
sua completa vingança bastava que<br />
o senhor avaliasse a dor, o remorso, a<br />
vergonha, a humilhação, que mepungiam<br />
constantemente ao lembrar-me<br />
de quanto era ingrato e desconhecido!<br />
Uma terrível mão de ferro<br />
havia-me empolgado o coração e<br />
espremia-lhe de dentro todo o fél de<br />
minhas dores. Tudo me atormentava,<br />
tudo me perseguia!Dormindo ou acordado<br />
tinha sempre defronte dos olhos<br />
o fantasma de meus crimes. Nem uma<br />
hora de repouso ! nem uma hora de<br />
felicidade ! Eu não podia encarar para<br />
o senhor, sem soffrer todos os tormentos<br />
de minha culpa; sua figura<br />
austera e veneranda produzia-me o<br />
effeito de punhaladas no coração;<br />
seu calmo ar de bondade, a brandura<br />
de seu gênio, a franqueza de seu caracter,<br />
eram para mim um supplicio<br />
constante. Pensei na morte, quiz por<br />
uma vez destruir esta vida inútil e<br />
miserável, e só Deus sabe quanto<br />
me custou não poder consumar esse<br />
desejo.<br />
— Faltou-lhe a coragem, disse o<br />
commendador—e todavia estava disposto<br />
a matar-me.<br />
— Juro-lhe que me custaria muito<br />
mais arrancar a sua vida do que a<br />
minha própria!<br />
— Nega então que tentou contra os<br />
meus dias?<br />
— Não, não nego. Porém afiançolhe<br />
que o faria, não por mim, mas<br />
pelo seu interesse e pelo interesse de<br />
sua mulher.<br />
— Explique-se.<br />
— Eu não podia fugir da fascinação<br />
que Thereza exercia sobre mim, mas<br />
eu igualmente não queria aviltal-a,<br />
fazendo d'ella minha amante, como<br />
não queria que o senhor em qualquer<br />
tempo corasse defronte da adultera.<br />
Matando-o, ella passaria a ser minha<br />
esposa e a memória do primeiro marido<br />
se conservaria incólume e respeitada.<br />
— De sorte que ainda lhe tenho de<br />
agradecer essa delicadeza, observou<br />
o commendador, com um ligeiro sor-'<br />
riso de ironia amarga.<br />
— Não zombe, commendador. Jurolhe<br />
que é sincero o que lhe acabo de<br />
dizer! Eu queria evitar a sua deshonra.<br />
Entretanto está tudo perdido,