Baixar - Brasiliana USP
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48 MYSTERIO DA TIJUCA<br />
leiro e legara seus bens ao único filho<br />
existente no Brazil, justamente como<br />
disse o conde a Gregorio no III capitulo,<br />
João Rosa, que ignorava a relação<br />
de Gregorio com o fallecido,<br />
guardou o seu segredo contra D. Januaria<br />
e Clorinda, e tratou de apoderar-se<br />
d'esta, fosse como fosse.<br />
Mal sabia elle o que havia de resultar<br />
de tudo isso!<br />
XIX<br />
O COMMENDADOR PELO AVESSO<br />
Tratemos agora de esclarecer os<br />
verdadeiros tramites do crime, de<br />
que foi injustamente suspeito o pobre<br />
Gregorio, e puxemos ás vistas de<br />
quem nos lê a figura do seu principal<br />
autor e a d'aquelles que lhe serviram<br />
de cúmplices.<br />
Se o leitor é pessoa de memória,<br />
deve ainda estar lembrado de dous<br />
typos de meia edade, que, no capitulo<br />
XI, dialogavam no café da menina<br />
do bandolim e tão empenhados<br />
pareciam no assumpto de sua conversa,<br />
que só resolveram a levantar<br />
o vôo, quando lhes foi dizer o<br />
dono da casa que desejava fechar a<br />
porta.<br />
Um d'esses dois typos, justamente<br />
o que parecia mais moço, estava ha<br />
muitos annos ao serviço do commendador<br />
Portella. Chamava-se Pedro<br />
Sarmento, era na sua roda mais conhecido<br />
pelocognomede Talha-certo.<br />
Fora na infância aprendiz marinheiro,<br />
depois servira na guerra do Paraguay,<br />
como voluntário do exercito, e<br />
afinal, sem profissão e sem padrinhos'<br />
cailira na dependência do commendador<br />
e servia-lhe de guarda-costas.<br />
O commendador tinha hábitos muito<br />
especiaes, muito seus—hábitos de<br />
viver na sua intimidade, que desdeziam<br />
totalmente d'aquellas jactancias,<br />
que lhe vimos ablaquear em<br />
casa de D. Januaria.<br />
No privado de sua casa era outro<br />
homem. Despia-se das fumaças da<br />
rua e dava-se todo ao prazer de estar<br />
ás soltas com o criado. Ahi não<br />
armava posições, não peneirava a<br />
phrase, não lembrava a sua importância<br />
social, nem as suas franquias<br />
de homem rico; ao contrario parecia<br />
farejar o que houvesse de mais banal<br />
e de mais degotado para lhe servir<br />
de palestra com o fâmulo.<br />
E,uma vez achado o fio do assumpto,'<br />
espojava-se nelle, voluptuosamente,<br />
como se quizesse refocillar das fadigas,<br />
que lhe impunha o seu viver<br />
de homem superior.<br />
Elle, que nas salas, ao ouvir fallar<br />
da quebra do banco tal, da fallencia<br />
d'este ou d'aquelle negociante, do<br />
bom ou máo êxito de taes e taes emprezas,<br />
sacudia sempre os hornbros<br />
com desdém e dizia entre dentes que<br />
tudo isso era bagatellas! Bagatellas!<br />
Ouvia, entretanto, com muito interesse<br />
as frioleiras, que á noite, ao despil-o<br />
para a cama, lhe contava em camaradagem<br />
o seu Talha-certo.<br />
Qnanto mais frivolo era o assumpto,<br />
tanto mais elle o esmiuçava, o esmerilhava,<br />
já o interrompendo com perguntas<br />
curiosas, já fazendo exclamações<br />
de sorpreza, já obrigando o<br />
criado a repetir o facto com mais minudencia<br />
e convicção.<br />
Depois atirava-se á cama, e, todo<br />
retrahido nos lençóes e abraçado aos<br />
travesseiros, deixando só de fora o<br />
seu carãoafogueado,provocava Talhacerto<br />
a. novos esclarecimentos, e saboreava<br />
as palavras do criado com um<br />
gosto pueril de criança mexeriqueira.