Baixar - Brasiliana USP
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160 MYSTERIO DA TIJUCA<br />
— Mas, filha, olha que é o único<br />
recurso que ha!<br />
— Pois então mato-me !<br />
— Deixa-te de tolices !<br />
— Duvidas?!<br />
— Não duvido, mas reprovo.<br />
E ficaram calados por algum tempo.<br />
— Eu vou buscar-te a ceia, disse<br />
afinal Portella, erguendo-se da cama,<br />
onde se havia assentado.<br />
— Não quero nada! respondeu<br />
ella de máo humor.<br />
— D -ixa-te d'isso commigo ! pediu<br />
o outro, ameigando-a por condescendência.<br />
— Solta-me! resmungou ella, empurrando-o.—Deixa-me<br />
! Deixa-me !<br />
E poz-se a chorar.<br />
— Agora temos choro! disse o<br />
rapaz, cocando a cabeça em um grande<br />
embaraço.<br />
Thereza soluçava, a chamar-se desgraçada,<br />
a maldizer-se, a pedir que<br />
a matassem.<br />
— Tu me fazes perder a pnciencia!<br />
exclamou Portella, finalmente, com<br />
um arremeço.— Ora ! estou a dizer-te<br />
os apuros em que me vejo; e tu a te<br />
fazeres desentendida!<br />
E depois de passeiar pelo quarto,<br />
com as mãos nas algibeiras, parou<br />
defronte da amante e disse-lhe com<br />
voz áspera:<br />
— Pois, filha, se não quizeres ir<br />
para a casa de t°u marido, vai para<br />
onde melhor o entenderes; eu não<br />
posso tomar conta de ti ! Ahi tens !<br />
— Tu és um cachorro ! disse ella,<br />
quasi sem respiração.<br />
— E' melhor não puxarmos pela<br />
lingua ! respondeu Portella desabridamente<br />
— porque te podias sahir<br />
muito mal n'este negocio !<br />
— Quem sabe se tenho medo de<br />
ti?!<br />
— Peior!<br />
— Se te parece dá-me agora bordoada<br />
! Também é só o que falta !<br />
— O' muliier! cale-se com todos os<br />
diabos !<br />
— Foi bem f ito ! Quem me mandou<br />
acreditar em um canalha de tua espécie<br />
!?<br />
— Não ! Isso agora tenha paciência.<br />
Foi a senhora quem me provocou.<br />
Eu estava perfeitamente socegado<br />
!<br />
— Heim ?! Como ?! Você não me<br />
provocou?! E'a quanto pôde chegar o<br />
cynismo !...<br />
E, ambos, de facto convencidos<br />
que o outro era o provocador, discutiram<br />
ainda por algum tempc. Thereza<br />
afinal declarou que não sahia<br />
d'aquella casa, e que, ou Portella não<br />
faria a tal viagem, ou ella o havia<br />
de acompanhar!<br />
— Esta casa está paga somente até<br />
amanhã. Tu has de ir hoje mesmo<br />
para a companhia do commendador.<br />
— Eu não hei de apresentar-me lá<br />
n'este estado ! Você não vê que estou<br />
toda suja de sangue?!<br />
Ficou resolvido qu: Thereza iria<br />
primeiramente para a casa da madrasta,<br />
que morava n'esse tempo no<br />
Cattete, e d'ahi então escreveria ao<br />
marido. Com muita repugnância aceitava<br />
ella esse alvitre, porque entre<br />
as duas houvera antes do casamento<br />
constantes desavenças, e depois d'elle<br />
poucas vezes se visitaram.<br />
A madrasta de Thereza era mulher<br />
de máo gênio, muito ignorante, não<br />
sabia estar em sociedade e dizia asneiras<br />
na conversa. O commendador<br />
a recebeu sempre com uma indifferença<br />
repulsiva, nunca a convidou<br />
para se demorar; ás vezes dava festas<br />
e nunca se lembrava de mandar cha-