Baixar - Brasiliana USP
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os seus direitos. Tu n'esse caso, não<br />
serás minha amante, serás minha<br />
esposa. Eu te poderei levar para toda<br />
a parte, apresentar-te dignamente<br />
em todas as rodas, e, o que é melhor,<br />
viver socegado, sem ter de evitar<br />
conversas a teu respeito, sem ter de<br />
quem receiar e de quem fugir!<br />
— Mas é abominável matar uma<br />
creatura! considerou Thereza, affiicta.<br />
— Ora, filha! Ab >minavel é um<br />
velho daquelles lembrar-se de casar<br />
comtigo! Que diabo! Quem não quer<br />
ser lobo não lhe vista a pelle ! Pois<br />
aquelle homem não devia comprehender<br />
logo que tu não te poderias<br />
contentar com elle ? ! Para que então<br />
casou?! Se algum de vocês dous tem<br />
razão, és tu, minha tola, porque tu<br />
foste a lezada, foste a victima. Casando-te,<br />
levaste um capital de mocidade,<br />
de frescura, de amor; tinhas<br />
direito a exigir de teu noivo uma parte<br />
correspondente! Se omatares, outra<br />
coisa não fazes mais do que cortar a<br />
grilheta que te amarraram aos pés.<br />
Eras inexperiente, não tinhas siquer<br />
uma idéa do que fosse a vida, a felicidade<br />
conjugai; teu corpo de virgem<br />
não exigia cousa alguma, porque nada<br />
conhecia. Entretanto umhomem decrépito<br />
e inútil ambicionou amarrar<br />
o teu destino ao d'elle; pediu-te á tua<br />
família, elle era rico, deram-te, ou melhor<br />
venderam-te. Mas tu, um bello<br />
dia acordaste. acordaste mulher; tiveste<br />
então as tuas aspirações, os teus<br />
desejos. O amor reclamou os seus<br />
direitos, o coração precisava comer !<br />
Bem, o que te competia decidir n'este<br />
caso?! — Das duas uma — ou abraçares<br />
o papel de victima. e resignares-te<br />
a aturar o trambolho a que<br />
te prenderam, ou então reagir e entregares-te<br />
francamente ao homem<br />
19<br />
MYSTERIO DA TIJUCA 145<br />
que escolhesses. Tu escolheste um,<br />
fui eu! Agora está dado o passo;<br />
voltar atraz seria loucura; e para<br />
proseguir só ha um meio — é dar<br />
cabo do commendador.<br />
— Mas isso é um crime horrível!<br />
respondeu Thereza, segurando a cabeça<br />
com ambas as mãos.<br />
— Crime horrível, torno-te a dizer,<br />
foi o teu casamento com aquelle velho<br />
! Isso é que é crime horrível, por<br />
que é a morte sem a morte, é a morte<br />
sem a insensibidade e sem o esquecimento<br />
!<br />
— Em todo o caso, considerou a<br />
rapariga, desafrontando o peito com<br />
um enorme suspiro.—Se elle se casou<br />
commigo, é porque me amava e porque<br />
suppuuha fazer-me feliz!<br />
— Criança ! exclamou o outro com<br />
um gesto de compaixão — Porque te<br />
amava ! grande fúria, na verdade !<br />
Comprehendo que houvesse no amor<br />
do commendador alguma porção de<br />
generosidade e abnegação, se fosses<br />
uma mulher feia e difficil de supportar;<br />
mas tu,moça, encantadora,e<br />
cheia de attractivos. Tu,que tens esses<br />
olhos, esses dentes e essas carnes,<br />
não podes receber como um obséquio<br />
o amor que te votam. Não ! porque<br />
esse amor nada mais é que uma<br />
manifestação do egoísmo! O commendador<br />
casou-se comtigo, não<br />
para te prestar um serviço, mas sim<br />
para prestar um serviço a elle próprio.<br />
Amou-te por amor d'elle e não<br />
por amor de ti! Não ha por conseguinte<br />
no acto do commendador<br />
a menor idéa de sacrifício e de abnegação.<br />
Mas, dada a hypothese que<br />
elle, não se contentasse em dar-te<br />
unicamente o nome de esposa, e des-<br />
se-t e todos os bens que se possam imaginar,<br />
ainda assim não havia a