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Baixar - Brasiliana USP

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O Talha-certo, que lhe já conheeia<br />

as manhas, dava-lhe a chupar só<br />

cousas lisongeiras e, com muita<br />

adulação, arranjara sempre um meio<br />

de incensar o amo. Ora, contava-lhe<br />

o que a seu respeito lobrigara de tal<br />

senhora; ora, referia um facto ridículo<br />

de algum sujeito, que pretendia competir<br />

em fortuna com o Portella;<br />

ora, finalmente, tirava mesmo elle do<br />

thuribulo e passava a defumar o<br />

patrão por conta própria.<br />

E estes pequeninos encomios, obscuros<br />

e sem garantia, punham no<br />

velho coração do commendador um<br />

prazer delicioso.<br />

— Então o tal sujeito gostava de<br />

me ouvir, Talha-certo ?!<br />

— O que ?! ficou abysmado ! Disse<br />

que vocemecê fallava que nem um<br />

padre 1<br />

— Deixa-os lá! Ainda não ouviram<br />

nada!...<br />

— Não ! Mas olhe que vocemecê<br />

tem um modo as vezes de dizer as<br />

cousas, que faz a gente ficar mesmo<br />

olhando.<br />

— Achas, Talha-certo ?!<br />

— Não sou eu sò quem acha — são<br />

todos.<br />

— Cousas !<br />

No dia seguinte, Portella envergava<br />

a sobrecasaca, mettia-se no<br />

chapéo alto de castor, enfiava as<br />

luvas escuras de pellica, tomava a<br />

sua bengala de castão amarello e,<br />

quando ganhava a rua com o seu<br />

passo arrogante, a sua grande figura<br />

aprumada e sobranceira, ninguém<br />

seria capaz de advinhar que ia alli a<br />

mesma creatura mulherenga, que<br />

adormecera na véspera a babar-se<br />

com os gabos de um criado inepto.<br />

Também era só o Talha-certo quem<br />

desfructava as privanças do commen­<br />

MYSTERIO DA TIJUCA 49<br />

dador e quem lhe devassava as fraquezas<br />

da intimidade; para os mais<br />

era este o mesmo personagem, sempre<br />

cioso de sua estimação e de sua<br />

irrecusável valia.<br />

E quem precisasse obter qualquer<br />

cousa das mãos do Portella, nunca<br />

a alcançaria senão por intermédio do<br />

seu privado. Mas, em compensação,<br />

com esse tudo se obtinha, desde uma<br />

carta de fiança, até um empenho seguro<br />

para qualquer ministro.<br />

Foi em uma d'aquêllas conversas<br />

pueris que o commendador veio a<br />

saber que Jorge Ruivo estava no Rio<br />

de Janeiro.<br />

— Jorge Ruiv® ? 1 Exclamou Portella,<br />

saltando da cama e desfazendo<br />

o semblante piegas, com que costumava<br />

ouvir as confidencias do criado<br />

—Jorge Ruivo?!<br />

Não estás enganado, Talha-certol<br />

Não estou, não senhor. Era elle<br />

em pessoa; apenas tinha as barbas<br />

mais crescidas e a cabeça mais<br />

calva.<br />

Quando o vi, reconheci-o logo,<br />

por aquelle cestro antigo de sacudir<br />

a cabeça para a esquerda.<br />

— Ora esta ! Disse comsigo o commendador.<br />

— Quando digo que vocemecê me<br />

devia ter deixado aviar com uma<br />

navalhada aquella peste... Escusava<br />

agora de tel-o pela proa, porque o<br />

demônio é muito capaz de lembrar-se<br />

ainda do passado e...<br />

— Nada! Interrompeu o Portella,<br />

muito preoccupado—precisamos desembaraçar-nos<br />

d'aquelle homem! Só<br />

a idéa de que podia encontral-o na<br />

rua e soffrer qualquer desfeita, faz-me<br />

perder a cabeça!... Olha cá!<br />

E chegando-se mais para o criado,<br />

passou-lhe um braço no hombro e

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