literatura 20jul.pmd - CEAO - Centro de Estudos Afro Orientais ...
literatura 20jul.pmd - CEAO - Centro de Estudos Afro Orientais ...
literatura 20jul.pmd - CEAO - Centro de Estudos Afro Orientais ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Solano, o poeta negro<br />
Agradam-me profundamente os títulos <strong>de</strong> “poeta negro”,<br />
“poeta do povo”, “poeta popular”, às vezes usados <strong>de</strong> modo<br />
<strong>de</strong>preciativo — mas que me dão uma consciência exata do<br />
seu papel <strong>de</strong> poeta na <strong>de</strong>fesa das tradições culturais do meu<br />
povo, na luta por um mundo melhor. Unir o universal ao<br />
regional, num poema participante ou amoroso, num verso<br />
<strong>de</strong> protesto ou ternura — mas em palavras compreensíveis.<br />
Quem me ouvir, ouça (Solano Trinda<strong>de</strong>, 1961).<br />
A obra poética <strong>de</strong> Solano Trinda<strong>de</strong> é repleta <strong>de</strong> musicalida<strong>de</strong><br />
e ritmo. A temática é variada; fala <strong>de</strong> problemas sociais, da beleza,<br />
do amor, <strong>de</strong> amores, da vida cotidiana, das tradições populares afrobrasileiras.<br />
Segundo Álvaro <strong>de</strong> Farias, 19 os primeiros poemas <strong>de</strong> Solano<br />
eram, em maior parte, voltados para o social. Porém, nos últimos<br />
anos <strong>de</strong> sua vida, a velhice passou a ser o tema mais constante <strong>de</strong><br />
seus escritos. Conforme palavras do crítico, “os últimos poemas<br />
eram <strong>de</strong> queixas, lembravam as mulheres distantes com nostalgia<br />
e se fixavam num triste <strong>de</strong>scrédito para com a própria vida que,<br />
afinal — sabia ele —, estava indo embora <strong>de</strong> maneira inevitável”.<br />
Solano era amante <strong>de</strong> uma linguagem simples. Não se preocupava<br />
em seguir esta ou aquela escola literária da poesia brasileira.<br />
Talvez, por isso, tenha podido empregar à poesia cunhada em<br />
meio à beleza e angústia, todo seu espírito, sua cor, sua raça, sua<br />
luta. Tudo isso, como bem o disse o próprio Solano, em palavras<br />
compreensíveis.<br />
... o meu canto<br />
é o grito <strong>de</strong> uma raça<br />
em plena liberda<strong>de</strong><br />
(...) Eu canto aos Palmares<br />
odiando opressores<br />
<strong>de</strong> todos os povos<br />
<strong>de</strong> todas as raças<br />
<strong>de</strong> mão fechada<br />
contra todas as tiranias<br />
Literatura afro-brasileira 141<br />
Solano Trinda<strong>de</strong> (1908-1974) – Poeta, cineasta,<br />
pintor, homem <strong>de</strong> teatro e um dos maiores animadores<br />
culturais brasileiros do seu tempo, o<br />
pernambucano Francisco Solano Trinda<strong>de</strong> foi, para<br />
vários críticos, o criador da poesia<br />
“assumidamente negra” no Brasil.<br />
Francisco Solano Trinda<strong>de</strong> nasceu em 24 <strong>de</strong> julho<br />
<strong>de</strong> 1908, em Recife (PE). Filho <strong>de</strong> Manoel Abílio Trinda<strong>de</strong>,<br />
sapateiro, e Emerenciana <strong>de</strong> Jesus, quituteira,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito cedo acompanhava o pai em danças<br />
<strong>de</strong> pastoril e bumba-meu-boi. Alguns críticos atribuem<br />
a esse fato o gran<strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> Solano Trinda<strong>de</strong><br />
pelo folclore, o teatro e a cultura populares.<br />
Depois que <strong>de</strong>ixou o Recife e fixou residência no<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro, Solano Trinda<strong>de</strong> foi o i<strong>de</strong>alizador<br />
do I Congresso <strong>Afro</strong>-Brasileiro (1934) no Recife e<br />
o II em Salvador. Anos mais tar<strong>de</strong> (1945), criou,<br />
com Abdias do Nascimento, o Teatro Experimental<br />
do Negro.<br />
Depois (1959), concretizou um dos seus gran<strong>de</strong>s<br />
sonhos, fundando, com apoio do sociólogo Edson<br />
Carneiro e <strong>de</strong> sua mulher Maria Margarida, o<br />
Teatro Popular Brasileiro (TPB). O elenco do TPB<br />
era formado por domésticas, operários, estudantes<br />
e comerciários. Eram espetáculos <strong>de</strong> batuques,<br />
lundus, caboclinhas, jongo, moçambique,<br />
congadas, caxambus, cocos, capoeiras,<br />
maracatus, samba <strong>de</strong> umbigada, folias <strong>de</strong> reis,<br />
dança das fitas.<br />
Solano chegou a percorrer alguns países da Europa<br />
com os espetáculos, apresentando em teatros<br />
e estádios populares. Alguns <strong>de</strong> seus poemas<br />
foram publicados em antologias estrangeiras.<br />
Em São Paulo, on<strong>de</strong> o TPB empolgou platéias no<br />
Teatro Municipal, foi ele quem transformou a cida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Embu, on<strong>de</strong> conheceu o escultor Assis, num<br />
centro cultural on<strong>de</strong> <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> artistas passaram<br />
a viver da arte.<br />
No teatro, foi Solano Trinda<strong>de</strong> quem primeiro encenou<br />
(1956) a peça Orfeu, <strong>de</strong> Vinícius <strong>de</strong> Morais,<br />
<strong>de</strong>pois transformada em filme pelo francês Marcel<br />
Cammus.<br />
No exterior, realizou o documentário Brasil Dança.<br />
Como ator, trabalhou nos filmes Agulha no Palheiro,<br />
Mistérios da Ilha <strong>de</strong> Vênus e Santo Milagroso.<br />
19 Farias, Álvaro Alves <strong>de</strong>. Poesia simples como a vida.<br />
In: Trinda<strong>de</strong>, Solano. Cantares ao meu povo. São<br />
Paulo: Brasiliense, 1981, p. 7-19 (prefácio).