literatura 20jul.pmd - CEAO - Centro de Estudos Afro Orientais ...
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Vejamos um trecho <strong>de</strong> um conto angolano:<br />
Ngana Fenda Maria<br />
Não havia mulher mais bonita que Ngana Fenda Maria.<br />
Um dia, ela teve uma filha que recebeu também o<br />
nome <strong>de</strong> Ngana Fenda Maria. Se a mãe era lindíssima,<br />
a filha, se possível, ainda a excedia em beleza.<br />
Então, uma vez, a mãe mandou comprar em Portugal o<br />
espelho que fala e todas as manhãs, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se lavar<br />
e vestir, ia junto <strong>de</strong>le e perguntava-lhe:<br />
— Ó meu espelho! Ó meu espelho! Diz-me se sou bonita<br />
ou feia!<br />
E o espelho respondia:<br />
— És muito bonita. No Mundo não há mulher mais<br />
bonita que tu!<br />
E, durante muitos dias, a cena repetiu-se, com a mesma<br />
pergunta e a mesma resposta. Mas uma vez, tendo<br />
a mãe saído, a filha, já crescida e que era a menina<br />
Fenda Maria, abriu a porta do quarto on<strong>de</strong> estava o<br />
espelho e mirou-se nele. Feito isto retirou-se.<br />
No dia seguinte, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se vestir, a mãe dirigiu-se<br />
ao espelho e repetiu-lhe a pergunta. O espelho respon<strong>de</strong>u:<br />
— Desengana-te, Ngana Fenda Maria. Tu, na verda<strong>de</strong>,<br />
és bonita. Mas se o é nove vezes, a tua filha, que<br />
esteve ontem aqui, é bonita <strong>de</strong>z vezes. 1<br />
Talvez nos cause surpresa reconhecer no início da história<br />
<strong>de</strong> Ngana Fenda Maria, algumas coisas que nos lembrem o conto<br />
“Branca <strong>de</strong> Neve”. Você <strong>de</strong>ve se recordar que Branca <strong>de</strong> Neve<br />
tinha uma madrasta que possuía um espelho ao qual consultava<br />
para saber <strong>de</strong> sua beleza.<br />
Esse tipo <strong>de</strong> <strong>literatura</strong>, baseada na tradição oral, nos traz<br />
estas surpresas e nos impulsiona a sonhar com um mapa que traçasse<br />
o itinerário <strong>de</strong>sses contos, registrando mudanças <strong>de</strong> ambientes,<br />
personagens e fatos. Por falar nisso, vamos conhecer agora<br />
um pouco do itinerário <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> personagens negros na<br />
<strong>literatura</strong> infanto-juvenil no Brasil.<br />
Literatura afro-brasileira 183<br />
1 MOUTINHO, José Viale (org). Contos Populares<br />
<strong>de</strong> Angola. Folclore Quimbundo. São Paulo: Landy<br />
Editora, 2000).