Scripta 9_2_link_final.pdf - Uniandrade
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Essa fala é o primeiro marcador que nos alerta sobre dupla<br />
temporalidade da narrativa fílmica. As ações que se reportam ao tratamento<br />
ao qual Vivian se submete no hospital são representadas através da<br />
linearidade, entrecortadas pelas constantes revisitações de tempos e lugares<br />
sedimentadas na memória pela narradora-protagonista. A estrutura temporal<br />
da narrativa assume aqui o tempo revertido 8 , que<br />
justifica-se através de razões psicológicas, pois “ao invés de<br />
desenrolar a ação fazendo com que o herói intervenha como um<br />
de seus elementos, é mais adequado concentrar nele o drama,<br />
consistindo a maior parte do filme na materialização de sua<br />
lembrança. Assim, ao atingir o paroxismo do seu drama, o herói<br />
revive as circunstâncias tumultuosas que o levaram a uma situação<br />
de desespero e solidão. (MARTIN, 2007, p. 227)<br />
Na adaptação fílmica, Vivian narra sua condição olhando fixamente<br />
para a câmera, como se estivesse conversando com o espectador (Fig. 4).<br />
Aqui o enquadramento da câmera é um grande aliado no processo de<br />
criação, objetivando apagar “a distância e o tempo que separam personagem<br />
e espectador-interlocutor” (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 1994, p. 109).<br />
No segundo flashback do filme, ao lembrar ter sido aluna da grande<br />
professora E. M. Ashford, especialista em John Donne, Vivian rememora<br />
a crítica feita por sua professora sobre a pontuação usada inadequadamente<br />
no poema “Morte não sejas orgulhosa”.<br />
Nesta cena, há uma fusão de espaços – quarto hospitalar e sala da<br />
professora Ashford – e percebe-se que Vivian revive esta cena com tanta<br />
intensidade que chega a sentir a presença da professora Ashford no quarto<br />
do hospital. Segundo Martin (2007, p. 208), o cinema tem o privilégio de<br />
ser “uma arte do tempo que goza igualmente de um domínio do espaço”. A<br />
dominação que Nichols exerce sobre o tempo, e a vigorosa representação<br />
que torna sensível a duração, cria “um espaço vivo e intimamente integrado<br />
ao tempo, a ponto de torná-lo um continuum espaço-duração absolutamente<br />
específico” (Figs. 5-8).<br />
<strong>Scripta</strong> <strong>Uniandrade</strong>, v. 9, n. 2, jul.-dez. 2011 83