Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras - World ...
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filhotes <strong>de</strong> peixe, tartaruga, plâncton, re<strong>de</strong>s dos pescadores -que muitas vezes são<br />
ameaçados em suas canoas em alto mar. Neste momento, a lógica é outra, o uso do recurso<br />
natural dá-se em outro ritmo e escala. Tanto na floresta como no mar, o que se tem são<br />
novos territórios estabelecidos através do po<strong>de</strong>r político-econômico <strong>de</strong> outros grupos que<br />
não as comunida<strong>de</strong>s tradicionais locais.<br />
Outras localida<strong>de</strong>s costeiras do Brasil atestam o mesmo impacto do arrasto e das<br />
embarcações motorizadas sobre a pesca realizada em canoas a remo. Descrevendo<br />
comunida<strong>de</strong>s pescadoras do litoral <strong>de</strong> <strong>São</strong> <strong>Paulo</strong>, DIEGUES 99 relata:<br />
“Nesse ecossistema limitado e explorado pela comunida<strong>de</strong> dos pequenos<br />
pescadores, até alguns anos, era impensável o arrasto do camarão-legítimo,<br />
pois essa técnica estaria <strong>de</strong>struindo as bases mesmas da subsistência da<br />
irmanda<strong>de</strong>. (...) o arrastão, que varre a costa à procura do camarão sempre<br />
mais escasso, jogando no mar toneladas <strong>de</strong> peixe acompanhante chamado lixo<br />
e que vem poluir as praias usadas pelos pequenos pescadores”.<br />
A floresta e o mar são territórios <strong>de</strong> manutenção concreta das comunida<strong>de</strong>s<br />
tradicionais e também espaços <strong>de</strong> alimentação do imaginário coletivo. A dimensão do<br />
imaginário traz referenciais constitutivos que unem as socieda<strong>de</strong>s e se projetam no espaço:<br />
sistemas <strong>de</strong> representações, símbolos, mitos e lendas construídos através das experiências<br />
cotidianas na <strong>de</strong>finição das carências e fornecimento <strong>de</strong> respostas, elementos simbólicos<br />
que selam sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural, referenciais <strong>de</strong> união comunitária. 100<br />
O imaginário é real e também a chave obrigatória para chegar à idéia do real, não é a<br />
parte afetiva ou face oculta da realida<strong>de</strong>, mas sua construção significante. Sua leitura<br />
permite chegar a realida<strong>de</strong>s concretas mais amplas, num caminhar dos elementos culturais à<br />
macroeconomia, por exemplo. Neste caminho metodológico, a economia não é o carro<br />
chefe das explicações e causa última <strong>de</strong> todos os fenômenos. I<strong>de</strong>ologicamente, a<br />
manipulação do imaginário que a dominação seja legitimada pelos dominados.<br />
99 I<strong>de</strong>, ibi<strong>de</strong>m, p. 193.<br />
100 SÉNÉCAL,G. “Aspects <strong>de</strong> l’imaginaire spatial”. In: Annales <strong>de</strong> Géographie n.º563,jan/fev.1992, pp.28-<br />
45.<br />
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