SUJEITO SABERES E PRÁTICAS SOCIAIS
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142<br />
Aqui tem quem lhe amorteça<br />
Rogaciano apareça<br />
Que o povo quer lhe escutar<br />
Nesta poesia, um dos antepassados aparece fazendo a mediação<br />
entre o mundo dos vivos e dos mortos. É ao mundo dos ancestrais míticos<br />
que o poeta pede licença à imortalidade. O cantar amplia o sentido da<br />
história contada, ao mesmo tempo em que dá vida aos mortos. Deste<br />
modo, os poetas do presente esperam escrever seu próprio futuro,<br />
cantando para serem lembrados e permanecerem vivos, depois de mortos.<br />
O cantar contribui para que um poeta que viveu no passado seja<br />
conhecido e lembrado, a fim de que desça e volte para explicar que o mito<br />
é cíclico, que não sofre os efeitos da passagem do tempo.<br />
Observando a passagem do tempo, o cantar/contar mítico também<br />
se enlaça aos elementos da natureza, onde se encontra com os fatos<br />
geradores da memória, no lugar em que as águas do passado vêm à tona,<br />
misturando-se ao corpo presente. Assim o poeta Sebastião Dias canta:<br />
Quando o rio flutuante<br />
Desce lá dos seus cenários<br />
Com espumas borbulhantes<br />
O real imaginário<br />
Envolvidos nos remansos<br />
Dos quais imensos balanços<br />
Sobe e desce o corpo nu<br />
E uma criança sem máculas<br />
Ali pura como as águas<br />
Do leito do Pajeú<br />
No cantar mitopoético do repentista, o corpo humano se mistura<br />
com as águas para ganhar forma e vida. De acordo com a construção<br />
arquetípica de Bachelard (1977), a água faz parte da primeira configuração<br />
da imaginação poética, assumindo, como elemento da natureza, a função<br />
de dar materialidade ao devaneio poético, ou melhor, de envolvê-lo com