SUJEITO SABERES E PRÁTICAS SOCIAIS
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Para Viveiros de Castro (2002, p. 335), a valorização teórica da<br />
antropologia do parentesco, ou a chamada “economia moral da<br />
intimidade” está contida mais na ética da consanguinidade que na<br />
simbólica da afinidade. Esta leitura coincide com a de Souza (2004), para<br />
quem o parentesco desta antropologia é menos como “identidades sociais<br />
dadas no casamento e fixadas em um conjunto de posições estruturais, mas<br />
antes como um processo de becoming” (Rival, 1998 apud Souza, 2004, p.43).<br />
O problema que se apresenta diz respeito à passagem da esfera das<br />
relações internas do grupo local à esfera das relações supralocais,<br />
remetendo, por sua vez, a definição do que é interno e/ou externo. Duas<br />
ideias podem ser apresentadas no intuito de apontar alguma solução ao<br />
problema posto. A primeira refere-se ao conjunto de relações supralocais<br />
que atravessa diferentes esferas sociocosmológicas e abrange plantas,<br />
animais, espíritos e divindades, cuja circulação ocorre em múltiplos canais<br />
que ligam ou separam os humanos entre si. Isto significa aludir relações de<br />
identificação e de diferenciação, cuja agência está em seres humanos e nãohumanos,<br />
remetendo para a necessidade de voltar à atenção para a<br />
perspectiva dos ameríndios sobre si e sobre os outros (Viveiros de Castro,<br />
2002).<br />
A segunda ideia diz respeito ao fato de entre os ameríndios, a<br />
alteridade se traduzir antes em uma estrutura, na qual o interior é um<br />
modo do exterior e, como tal, só pode se constituir ao se pôr fora dele do<br />
que uma unidade metafísica superior. O exterior, segundo a lógica dos<br />
ameríndios, é imanente ao interior. A alteridade, por seu turno, é uma<br />
relação constitutiva, representando assim a inexistência de um meio<br />
absoluto de interioridade, pois qualquer lugar do exterior é um foco de<br />
interioridade possível (cf. Viveiros de Castro, 2002). O que existe realmente<br />
entre os ameríndios é uma abertura ao exterior, e este é um traço interno<br />
da estrutura como um todo, correspondendo ao que Lévi-Strauss chamou<br />
na História de Lince de dualismo concêntrico; na visão dele, tal dualismo<br />
encontra-se em desequilíbrio perpétuo entre os polos da identidade<br />
consangüínea e a da alteridade afim.<br />
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