SUJEITO SABERES E PRÁTICAS SOCIAIS
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Nota-se aqui como Foucault relaciona a ficção com a categoria do<br />
aspecto, conforme indicado anteriormente, uma categoria espacial que<br />
indica fundamentalmente a trama estabelecida na relação do falante com o<br />
que ele fala, a rede que se forma no âmbito dessas relações. A fábula é da<br />
ordem da sucessão temporal do conjunto de fatos e ocorrências que<br />
constituem a ação em uma obra de ficção, do tempo cronológico em que<br />
personagens realizam coisas em uma sequência linear, âmbito do que se<br />
considera o enredo ou a intriga, já a ficção é uma categoria que organiza e<br />
fixa o jogo interno em que esses elementos da fábula entram em relações<br />
específicas uns com os outros, em que as falas tanto do narrador quanto<br />
dos personagens produzem efeitos de sentido que só tem lugar nessa trama<br />
relacional, e não fora dela, mas que é, por isso mesmo, o aspecto principal<br />
que define uma obra, sua condição de possibilidade, visto que os<br />
elementos da fábula podem entrar em jogos ficcionais diversos<br />
dependendo do modo de ficção em que eles estejam dispostos. Segundo<br />
Foucault (1994, p. 506), os elementos da fábula dependem de algo que é<br />
dado previamente à construção ficcional, estão enraizados nas<br />
“possibilidades míticas da cultura; sua escrita se aloja no interior das<br />
possibilidades da língua”, já sua ficção se situa “no interior das<br />
possibilidades do ato de fala”. Os elementos da fábula dependem da língua<br />
e dos valores dados de antemão por uma cultura determinada; os atos de<br />
fala se referem ao desempenho dos falantes no desenrolar da narrativa,<br />
dizem respeito ao lugar do sujeito na trama narrativa, em que os sujeitos da<br />
fala ocupam posições variadas dependendo do lugar em que se situam<br />
nesse jogo narrativo. A ficção se refere, portanto, às práticas narrativas que<br />
são postas em jogo no interior da obra.<br />
Foucault chama a atenção para o fato de que alguns modos<br />
ficcionais, ao longo da história, teriam sido privilegiados em detrimentos<br />
ou pela supressão de outros, como é o caso da literatura do século XIX,<br />
em que se vê a predominância de um discurso único, quer seja de um<br />
narrador presente na narrativa, ou recuado em relação a ela; ou como no<br />
caso das “Mil e uma noites”, em que, apesar de se ver a presença de vários<br />
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