SUJEITO SABERES E PRÁTICAS SOCIAIS
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descobrimento de si, procura pela verdade do mundo e pela verdade de si,<br />
a realização de seu processo de formação em busca de sua identidade<br />
autêntica; mas, vistos sob a ótica da ficção, eles são justamente o contrário<br />
dessa jornada de autoconsciência e auto-apropriação do eu, é uma narrativa<br />
cuja lei é a da decepção e da metamorfose, o herói que busca a verdade não<br />
a encontra, o que aparece a ele é uma realidade diferente daquela buscada,<br />
realidade que transfigura o mundo e a si mesmo simultaneamente. A voz<br />
neutra da ciência por detrás da fábula não é recuperada pelos personagens<br />
como uma experiência formativa que um olhar sobre a fábula considerada<br />
em si mesma poderia sugerir, mas ao contrário, ela se mantém indiferente e<br />
inacessível à construção de suas próprias identidades ao final de cada<br />
aventura. A experiência propiciada pela voz distante da ciência nos<br />
romances de Julio Verne, aos olhos de Foucault, mantém a tensão desse<br />
vazio, desse sujeito neutro, sem nome que articula o regime da narrativa.<br />
A experiência do neutro, a experiência do vazio, põe a distância<br />
também o sujeito em relação a si mesmo, mas não a uma distância<br />
duplicadora de si, apropriativa de si, imagem do idêntico, mas a uma<br />
distância que é aquela do “eu falo”, da linguagem “que revela mais um<br />
afastamento do que uma retração, mais uma dispersão do que um retorno<br />
do signo sobre eles mesmos.” (FOUCAULT, 1994, p. 520). É que essa<br />
linguagem neutra que Foucault identifica nas ficções de Blanchot produz,<br />
mais que imagens, “a transformação, o deslocamento, o intermediário<br />
neutro, o interstício das imagens”, ele completa afirmando que “a ficção<br />
consiste, portanto, não em mostrar o invisível, mas em mostrar o quanto é<br />
invisível a invisibilidade do visível” (FOUCAULT, 1994, p. 524).<br />
A linguagem da ficção é uma linguagem que produz esse<br />
afastamento, que é afastamento simultâneo tanto de uma positividade do<br />
mundo, quanto de uma subjetividade identitária, há como que uma<br />
incompatibilidade entre a linguagem da ficção e a identidade da consciência<br />
de si, daí os efeitos dessubjetivantes de uma tal experiência, pois ela é<br />
experiência de si enquanto espaço da diferença, do negativo que, à<br />
diferença da dialética, não produz uma síntese dos contrários, mas se<br />
mantém nessa abertura do diferir-se de si nesse afastamento, nessa