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A-Escola-dos-Deuses-Formacao-Elio-DAnna

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vegetal abraçando as laterais de um barco. A elegância de cada detalhe, as

obras de arte, os preciosos quadros e as modernas esculturas em mármore

branco deixaram-me agradavelmente perplexo e hesitante quanto à verdadeira

natureza daquele ambiente incomum. De duas amplas claraboias precipitavase

como chuva a primeira luz da manhã. Observei as imensas vigas que

sustentavam o teto e minha imaginação foi raptada pelo pensamento de qual

titã as teria transportado e fixado ali onde estavam. Mais vezes explorei com

o olhar cada ângulo, mas do Dreamer não encontrei nenhum vestígio. Fazia

quase um ano que não O via. Continuando, vi que na parte central do chão

daquele ambiente havia um espelho d’água. Mais que uma piscina, parecia

uma lagoa azul escavada na terracota. Um movimento constante encrespava a

superfície da água, como um calafrio. Percorri com o olhar a margem, até

que, suave como uma leve onda, vi Sua imagem. Lentamente, ergui o olhar

até Seu rosto. O Dreamer trazia nos lábios uma flauta de prata. Arqueou o

corpo com graça e levantou o rosto junto àquele cintilante apêndice em

direção à luz. O ar encheu-se de notas enfileiradas, uma após outra, como

pérolas de um colar. Era uma música sem idade, sem tempo, como aquela

casa, aquela sala, aquele momento. Imóvel, escutei. Revivi o entusiasmo da

minha infância, perfumada de mar, sua felicidade esquecida. O desatino das

corridas sobre os rochedos, o sabor dos vôngoles e dos caranguejos recémmariscados,

as batidas do coração antes dos mergulhos mais desvairados dos

rochedos... a sombra fresca da casa de Ischia, os beijos suados de Carmela no

retorno do mercado...

Uma nota ficou suspensa no ar mais que as outras, flutuou sobre o

respiro que a havia criado, brincou ainda um pouco com as moléculas do ar,

até se liberar da música e tornar-se um único e vibrante sopro sonoro. Parou

de repente. Pela eternidade de alguns segundos, a flauta permaneceu

transversa, colada ao lábio inferior, depois seguiu docemente a mão que a

descansou sobre uma almofada ao lado. Estava mais jovem de como O

recordava e me pareceu ainda mais magro. Levantou Seu olhar e me

examinou longamente. Decerto sabia dos esforços que eu havia feito para

retornar a Ele... das longas buscas do manuscrito e do sucesso da minha

missão, da paixão com que eu havia estudado e me aproximado do

pensamento da Escola. Depois do turbulento encontro que havia tido no

início do meu aprendizado e a bem-sucedida viagem ao meu passado iniciada

em Marraquesh, eu esperava alguma palavra de estímulo, senão de elogio.

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