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A-Escola-dos-Deuses-Formacao-Elio-DAnna

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interlocutores islâmicos interromperem a reunião e retirarem-se para a

oração. Advertiam que aqueles poucos minutos de interrupção de algum

modo os revigorava. Eu não sabia como. Tentei indagar a razão mais

profunda daquela prática religiosa, a inteligência oculta naquele ritual, mas

ninguém soube me dar uma explicação que fosse além de uma visão carola,

supersticiosa. Durante um dos encontros com o Dreamer, encontrei

oportunidade para Lhe perguntar. A explicação que recebi teve um peso

especial na minha preparação. Anotei-a fielmente.

As tradições sapienciais, através dos milênios, inventaram e

transmitiram toda espécie de truques para contestar a rigidez, a repetição à

qual inevitavelmente as pessoas são propensas. A genuflexão dirigida a Meca

cinco vezes ao dia, o ritual do jejum do Ramadã no nono mês do ano lunar

islâmico e os rituais presentes em todas as tradições religiosas podem ser

definidos como rasteiras na mecanicidade. A função é alimentar a

inteligência então entorpecida, latente pela interrupção de rotinas,

estimulando os seres a se desviarem das trilhas dos hábitos arraigados.

O Dreamer continuou explicando que aquelas são normas de higiene

física, mental e espiritual das quais se perdeu o sentido, o aspecto inteligente

que lhes deu origem, e que hoje sobrevivem veladamente sob forma de

crenças religiosas, rituais já esvaziados de significado ou crendices. Bastaria

prestar um pouco de atenção aos nossos movimentos para descobrir quão

mecânica e repetitiva é nossa vida. Desde o amanhecer, damos início com

escrupuloso rigor a uma série de ações, sempre iguais: saímos da cama

apoiando o mesmo pé, começamos a fazer a barba sempre do mesmo lado,

escovamos os dentes repetindo o mesmo número de movimentos, nas

mesmas direções, com as mesmas caretas. Temos hábitos óbvios, exprimimos

as mesmas ideias usando gestos, linguagem e inflexões como sempre. Até

mesmo nossas emoções são previsíveis, como reflexos condicionados da

alma. No ser humano comum, a vontade é sepulta. Seu comportamento é o

reflexo de uma inteligência artificial e poderia mais proficuamente ser

estudado por ciências como a Etologia ou a Robótica, e não pela Psicologia.

Até mesmo quando está convicto quanto a tomar uma decisão, a fazer

uma escolha, a exprimir livremente sua vontade, com um mínimo de autoobservação,

todo ser humano poderia facilmente perceber que, na realidade,

está sendo guiado por processos mecânicos, está percorrendo velhos sulcos

mentais escavados por preconceitos e lugares-comuns, reproduzindo,

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