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A-Escola-dos-Deuses-Formacao-Elio-DAnna

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Judith, “a moça”

Giorgia e Luca chamavam-na de “a moça”. Apenas alguns anos mais

velha que eu, alta, atraente, Judith era uma pessoa reservada. Morava sozinha

na pequena casa atrás do nosso jardim. Nada a surpreendia verdadeiramente e

ninguém parecia interessar-lhe além dos seus livros e da música. Sua

expressão de imperturbável distanciamento era animada pelo bater intenso de

seus cílios, como que agitados por um estupor contínuo. Certifiquei-me de

que o Dreamer estivesse ainda ao meu lado e me aproximei de uma janela da

pequena sala de visitas. Sentia o ser sobressaltado como quando, à noite, eu a

procurava e sobre seu corpo descarregava meu medo, a incapacidade de

suportar aquilo que estava me acontecendo.

Revi o pequeno ambiente, as paredes forradas de livros, o sofá central

revestido de tecido floral, e Judith, que corria seus longos dedos sobre o

teclado enquanto eu lhe falava da doença de Luisa e do agravamento da sua

condição. Sua música invadiu a atmosfera fazendo vibrar cada átomo e

cresceu até cobrir infames palavras permeadas de mentira. Podia agora sentir

todo o horror dos pensamentos daquele homem, o odor nauseante de suas

intenções. Pela primeira vez eu via com clareza qual luta me lacerava as

vísceras: o embate entre a dor por aquela morte anunciada e a alegria secreta

e selvagem por me libertar da minha mulher, do peso daquele matrimônio

imaturo, desequilibrado.

A cortina da falsidade se levantou. Eu não podia mais me esconder.

Não seria mais possível. Atrás do pranto e do desespero daquele pequeno

homem, entre a pele e a máscara, vi o sorriso maligno da criminalidade.

Suspendi a respiração, horrorizado. Uma força irresistível me impediu de

fugir e me deteve imóvel diante da janela de Judith.

Revi a cena do nosso encontro. Luisa morria e eu me agarrava àquela

mulher, suplicando sua companhia, sua compaixão, seu corpo.

Quando Judith entendeu minhas intenções, impassível, não mudou de

atitude. Pegou-me pela mão e me acompanhou ao quarto, dando-me aquilo

que eu estava mendigando: sexo... para esquecer, para fugir, para encontrar

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