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A-Escola-dos-Deuses-Formacao-Elio-DAnna

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O segredo do fazer

Mergulhado nesses devaneios, eu nem havia olhado para o motorista

de táxi até que ele falou comigo.

“Você é italiano, certo?” perguntou com seu sotaque caipira e sorriso

satisfeito de alguém que acabou de ganhar uma aposta consigo mesmo. “Meu

pai era italiano”, continuou sem esperar por minha resposta. “Foi ele que me

deu o nome de Fiorello”.

O carro prosseguia lentamente pelo trânsito da cidade, ele me

contando a história de sua família: o avô analfabeto, que emigrou primeiro

para a Austrália e depois para a Inglaterra, que fundou uma fábrica de sapatos

e ficou muito rico. Seu pai, que se permitiu ser convencido por dois colegas

de squash a investir tudo que tinha em ações e dentro de poucas semanas

acabou sem um tostão. Fiorello confidenciou-me seu ressentimento para com

o pai, sua decepção inesquecível de ter que largar o canto, quando muito

novo ainda, para poder ganhar seu sustento. Ele me contou sobre sua licença

de táxi, a única dádiva do pai; da sua esperança de seu filho poder alcançar o

sonho que ele havia sido forçado a abandonar; sobre seus netos gêmeos

idênticos, que demonstravam excepcional inteligência em seus estudos em

casa, e que estavam certamente destinados para grandes feitos. Eles

indubitavelmente reconstruiriam o império fundado por seu antepassado

industrial.

A voz do motorista de táxi começou a esmaecer na retaguarda das

minhas preocupações, e enquanto a história continuava, eu me vi criança na

loja cheirando a talco de Don Saverio o brabeiro, com seu espelho empoado

numa moldura trabalhada. Dentro dessa luneta somente poucos traços do

antigo esplendor permaneciam, brilhantes ilhas flutuando sobre uma

superfície escurecida. Nela minha imaginação percebia um mapa de

continentes desconhecidos, com os contornos riscados de novos arquipélagos.

Quando menino, eu costumava observar Don Saverio trabalhando em meio a

imagens repetidas ao infinito de meu pescoço ser impiedosamente barbeado

de acordo com as instruções implacáveis da minha mãe. Essa procissão de

“eus” no espelho levemente inclinado atrás de mim - eu: de novo e de novo,

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