subjetividade em paul ricoeur.pdf - FILOSOFIANET

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1 - HISTÓRIA DA HERMENÊUTICA São muitos os autores que apontam a relevância dos estudos hermenêuticos na contemporaneidade, como Jean Greisch, o qual afirmou que a era atual é “a idade hermenêutica da razão”, idade na qual Ricoeur insere a obra básica da presente pesquisa 1 . Da mesma forma, poder-se-ia afirmar que “a hermenêutica é o novo nome da filosofia hoje” 2 . Cabe, nesse momento, apresentar a tradição hermenêutica sobre a qual se assenta o pensamento ricoeuriano. 1.1 – PRECURSORES DA HERMENÊUTICA RICOEURIANA 1.1.1 – A origem clássica hermenêutica – Platão e Aristóteles Os autores divergem quanto à etimologia de “hermenêutica”: há quem afirme que sua origem está vinculada a Hermes, o deus mensageiro da mitologia grega, o qual teria inventado a linguagem e a escrita para que os deuses se comunicassem entre si e pudessem repassar aos homens a vontade divina 3 ; outros, porém, ligam o termo ao verbo ερµηνευειν (hermeneuein), usado pelos gregos no sentido de expressar ou interpretar. Apesar de desacreditada – pelo fato de ser uma conclusão “demasiado patente para ser verdadeira” 4 , a alusão a Hermes revela o caráter mediador da hermenêutica. 1 RICOEUR, Paul. O si-mesmo como um outro. Trad. Lucy Moreira Cesar. Campinas: Papirus, 1991, p.38; SACADURA, Carlos Alexandre Bellino de Albuquerque. Percursos da Filosofia hermenêutica. Revista Portuguesa de Filosofia, Braga, tomo LII, jan.-dez. 1996, p.769. 2 MARCONETTI, Luís. Suplemento e desenvolvimento dos “Primeiros elementos de Filosofia”. Metódica: fenomenologia, hermenêutica simbólica. Campo Grande: UCDB, 2005, p.122. 3 Cf. NOVASKI, Augusto. Hermenêutica. Reflexão (Revista quadrimestral do Instituto de Filosofia PUCCAMP), Campinas, ano XXII, n.69 (A Hermenêutica de Paul Ricoeur), set./dez. 1997, p.108; MARCONETTI, op. cit., p.143. 4 Cf. GRONDIN, Jean. Introdução à hermenêutica filosófica. São Leopoldo: Unisinos, 1999, p.55. 13
Hermèneutiké apareceu incipientemente no Corpus platônico de forma equivalente à mantiké (arte de profetizar), a qual caberia tanto ao insano (incapaz de julgar a verdade) quanto ao profeta (provido de competência racional). Ambos os saberes eram considerados incapazes de conduzir à sofía (sabedoria), porque o intérprete só é capaz de entender o que é dito. Na obra Ion, Platão (428/427-347 a.C.) relaciona o hermeneuta ao profeta pelo fato de possuir o caráter de mediador – tanto entre os deuses e os homens, quanto entre os homens e o insano mediador 5 . Em Aristóteles (384/383-322 a.C.), hermeneia está presente em um dos tratados do Organon aristotélico, a obra lógico-semântica Пερì έρµηνείας (Peri hermeneias), que fora traduzida para o latim como De interpretatione ou Hermeneutica. Sua acepção é a de significação (comunicação) dos conteúdos da alma ao exterior, o que equivale à phoné semantiké (denominada pelos latinos como vox significativa): qualquer som vocal dotado de significado. Trata-se, pois, de uma mediação entre o pensamento e os destinatários 6 . Para o Estagirita, os termos e as orações (logos) são hermeneia, sobretudo aquelas declarativas ou assertivas (apophansis) – cuja função é “dizer algo de alguma coisa” – que seriam a hermenêutica autêntica, porquanto são as únicas orações cuja verdade ou falsidade pode ser demonstrada logicamente. Uma vez que Aristóteles centrou a interpretação no que é unívoco lógica e ontologicamente – “não significar algo uno é nada significar absolutamente” 7 – com o desenvolvimento da noção de “analogia do ser” houve uma abertura à polissemia, não como uma anomalia no discurso, mas como algo inevitável 8 . 1.1.2 – A exegese bíblica – Fílon, Orígenes, Agostinho, Lutero e Flacius Posteriormente, foram esboçadas várias definições de hermeneia: “o ‘logos’ expresso em palavras”, para Fílon de Alexandria; (por volta de 13-54 d.C.); correlativamente, 5 Cf. GRONDIN, op. cit., p.52-54; MORA, José Ferrater. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Loyola, 2001, vol. 3, p.2283. 6 Cf. GRONDIN, op. cit., p.52-53; MORA, op. cit., vol.1, p.181. 7 ARISTÓTELES apud RICOEUR, Paul. Da interpretação. Ensaio sobre Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1977, p.29. 8 Cf. RICOEUR, Da interpretação, p.30; Cf. MORA, op. cit., p.1326. 14
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