subjetividade em paul ricoeur.pdf - FILOSOFIANET
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esclarecer que estão presentes aí os mesmos processos de interpretação presentes no texto:<br />
dialética da compreensão e explicação, conjectura e validação, o conflito de interpretações 230 .<br />
No manuscrito não publicado Practical reason, de 1978, Ricoeur constrói uma<br />
teoria cont<strong>em</strong>porânea da razão prática, cujo centro é a referida intenção ética, isto é, o sentido<br />
com o qual uma ação é realizada – capaz de torná-la imoral, moral ou pré-moral. Por se tratar<br />
de um projeto, ela é um momento vazio, que é suscetível de ser preenchido com a ação e se<br />
especifica <strong>em</strong> três momentos: a liberdade na primeira pessoa, na segunda pessoa e na terceira<br />
pessoa. Nisso, importa muito a consideração de que há um aspecto negativo presente já no<br />
primeiro momento: a distância entre o “eu posso” e a realização efetiva dessa liberdade, o que<br />
caracteriza uma inadequação, que é a própria falibilidade humana – como o título de O<br />
hom<strong>em</strong> falível denota. Ética, conforme essa obra, significa, pois<br />
[...] esse movimento [pacours] de actualização, esta odisseia da liberdade<br />
através do mundo das obras, este verificar da verdade do poder-fazer-algo<br />
[pouvoir faire] nas acções efectivas que dão test<strong>em</strong>unho dela. [...] É o<br />
movimento entre a crença nua e a crença cega num ‘eu posso’ primitivo, e a<br />
história real onde certifico este ‘eu posso’[sic] 231 .<br />
A exposição desse entendimento inicial de uma ética hermenêutica no pensamento<br />
<strong>ricoeur</strong>iano trata-se de não mais que pressupostos para uma investigação mais apurada <strong>em</strong> O<br />
si-mesmo como um outro – obra-base deste trabalho – na qual persevera o t<strong>em</strong>a do poderfazer.<br />
Diante disso, convém ainda transcrever o que o próprio autor assinala como transição<br />
t<strong>em</strong>ática entre uma etapa e outra, cuja relevância traz o porquê dos esboços da teoria do texto<br />
<strong>em</strong> momentos anteriores:<br />
[...] Se a ética se pode intitular hermenêutica, isto apenas é possível na<br />
medida <strong>em</strong> que ela vai buscar à teoria da acção aquilo que esta deve à teoria<br />
do texto. Ora, o que é que ela vai buscar? Essencialmente, o enraizamento<br />
daquilo que então chamei “intenção ética” na experiência do “eu posso”.<br />
Não apenas não repudiei desde então essa referência ao “eu posso”, como<br />
lhe conferi um maior alcance ao alarga-lo muito para além da esfera da<br />
acção enquanto tal: o poder de se autodesignar como locutor das suas<br />
próprias palavras; o poder de se autodesignar como o agente de suas próprias<br />
acções; o poder de se autodesignar como o protagonista na sua própria<br />
história de vida – aqui exist<strong>em</strong> tantas utilizações de “eu posso”, que pode ser<br />
considerado coextensivo à noção de si. Desde Soi-même comme un autre,<br />
230 Cf. KLEIN, op. cit., p.201-204.<br />
231 RICOEUR, The probl<strong>em</strong> of the foundation of moral philosophy apud KLEIN, op. cit., p.206.<br />
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