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subjetividade em paul ricoeur.pdf - FILOSOFIANET

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qual se fala, o agente do qual depende a ação têm uma história, são sua própria história” 219 .<br />

Nesse momento, apresenta-se o máximo desenvolvimento da dialética entre as duas<br />

identidades referidas, que se distingu<strong>em</strong> conforme o modelo de permanência no t<strong>em</strong>po: a<br />

identidade-id<strong>em</strong> (mesmidade), que supõe uma estrutura ou substrato que permanece, resiste à<br />

mudança e que torna essa identidade passível de ser ligada à noção kantiana de substância 220 ;<br />

por outro lado, t<strong>em</strong>-se a identidade-ipse (ipseidade), a qual não se trata de uma permanência<br />

substancial, mas da “manutenção de si” – t<strong>em</strong>a heideggeriano da Selbständigkeit, também<br />

traduzida como “constância de si”. Enquanto a mesmidade da pessoa t<strong>em</strong> seu <strong>em</strong>bl<strong>em</strong>a no<br />

caráter, isto é, no “conjunto das marcas distintivas que permit<strong>em</strong> reidentificar um indivíduo<br />

humano como o mesmo” – de modo que ele é considerado o “o quê” do “qu<strong>em</strong>” 221 – a<br />

ipseidade t<strong>em</strong> seu modelo na fidelidade à palavra dada: ainda que mud<strong>em</strong> os próprios desejos<br />

e opiniões, a palavra é mantida, o que desafia o t<strong>em</strong>po e as mudanças e permite perseverar<br />

unicamente o “qu<strong>em</strong>”, isto é, o si-mesmo 222 .<br />

Para preencher a lacuna de sentido entre mesmidade e ipseidade, Ricoeur propõe a<br />

noção de “identidade narrativa”, que se liga à identidade do personag<strong>em</strong>. A grande<br />

contribuição é que se trata de uma identidade dinâmica porque, pelo fato de depender do ato<br />

de configuração do enredo, ela se caracteriza por uma “concordância discordante”, que<br />

concilia identidade e diversidade, b<strong>em</strong> como permite reconhecer as pessoas não somente<br />

como agentes, mas também pacientes. Por força das “variações imaginativas” próprias do<br />

enredo, as identidades narrativas tend<strong>em</strong> a oscilar entre uma ipseidade baseada na mesmidade,<br />

que resulta na estabilidade de um caráter – como se vê mais amiúde nos contos infantis e<br />

folclóricos – e uma ipseidade s<strong>em</strong> recurso da mesmidade – como o caso de alguns romances<br />

cont<strong>em</strong>porâneos, que eclipsam o caráter dos personagens a ponto de aproximar a narrativa de<br />

um ensaio. De qualquer forma, a teoria narrativa ocupa uma posição de mediação entre o<br />

descrever e o prescrever, prenunciando a ética pelo motivo de se enraizar na vida 223 e de não<br />

219 RICOEUR, O si-mesmo como um outro, p.137s.<br />

220 Tomada num sentido transcendental como “permanência do real no t<strong>em</strong>po”. Ad<strong>em</strong>ais, “todos os fenômenos<br />

contêm algo que permanente [das Beharrliche] (substância), tida como o próprio objeto, e alguma coisa mutável,<br />

tida como uma simples determinação desse objeto”. KANT apud RICOEUR, op.cit., p.143.<br />

221 O caráter “é o si sob a aparência de mesmidade”. Cf. Id., p.145;155. “O caráter [...] é a mesmidade no (ser)<br />

s<strong>em</strong>pre meu”, ou, como a tradução brasileira apresentou o termo mienneté, a “minha totalidade”, r<strong>em</strong>etendo à<br />

própria existência tomada como um todo. Ricoeur associa o caráter ao hábito (cuja sedimentação tende a mitigar<br />

a inovação) e às identificações adquiridas (identificação-com valores, normas, pessoas etc). Cf. Id., Sé come um<br />

altro, p.209.<br />

222 Cf. Id., O si-mesmo como um outro, p.137-166.<br />

223 “Com efeito, representação [mimésis] não de homens mas de ação de vida [bion] e de felicidade (a<br />

infelicidade também reside na ação), e o fim visado [télos] é uma ação [práxis tis], não uma qualidade [ou<br />

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