subjetividade em paul ricoeur.pdf - FILOSOFIANET
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Numa primeira etapa, as máximas da ação – que são, para Kant, “proposições que<br />
encerram uma determinação geral da vontade da qual depend<strong>em</strong> muitas regras práticas” –<br />
dev<strong>em</strong> submeter-se à regra de universalização, para que seja eliminada a impureza do desejo –<br />
que se opõe à razão por ser de ord<strong>em</strong> patológica. Daí procede o formalismo expresso no<br />
imperativo categórico: “Age unicamente segundo a máxima que faz com que tu possas querer<br />
ao mesmo t<strong>em</strong>po que ela se torne uma lei universal” 261 .<br />
Kant interiorizou o locutor e o colocutor do imperativo, de forma que o sujeito é<br />
um si capaz de comandar e de obedecer (ou desobedecer) – pois, à s<strong>em</strong>elhança de Platão, ele<br />
diferenciou na alma uma parte controlada pela lei e outra que é capaz de hesitar entre a lei e o<br />
desejo. Outro passo da proposta kantiana advém com a idéia de liberdade, que já não<br />
corresponde à vontade finita (dependente dos fenômenos), mas à vontade <strong>em</strong> sua estrutura<br />
fundamental. Com isso, t<strong>em</strong>-se a noção de autolegislação ou autonomia, segundo a qual a<br />
vontade deixa-se determinar somente pela forma legislativa das máximas: “Uma vontade à<br />
qual a pura forma legislativa da máxima pode servir de lei é uma vontade livre” 262 .<br />
Nisso, Ricoeur afirma que o formalismo chega ao mais alto grau com a oposição<br />
entre a autonomia e a heteronomia, tornando possível o tratamento de uma ipseidade moral:<br />
“quando a autonomia substitui a obediência ao outro pela obediência a si-mesmo, a<br />
obediência perdeu todo o caráter de dependência e de submissão. A verdadeira obediência,<br />
poderíamos dizer, é a autonomia”. Nisso aparece o conceito de “fato da razão” (Factum der<br />
Vernunft), que é a consciência da ligação entre liberdade e lei tida como algo apodítico –<br />
atestação da autonomia. Importante é a consideração de que não é a uma tese egológica que a<br />
tese de um si legislador postula conduzir, mas sim à universalidade do querer 263 .<br />
Ricoeur esclarece que, dentre as categorias kantianas, a estima de si não pode ser<br />
identificada com o “amor de si” – a presunção ou excessiva auto-benevolência, que é<br />
ilegítima e nula – mas com o “respeito de si”, que é a afeição à lei. Diante disso, Ricoeur<br />
esclarece que “o amor de si [...] é a estima de si pervertida [...] para o mal. E o respeito de si é<br />
261 KANT, Fundamentos da metafísica dos costumes. apud RICOEUR, O si-mesmo como um outro, p.243.<br />
262 KANT apud RICOEUR, O si-mesmo como um outro, p.245.<br />
263 Cf. Id., p.246.<br />
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