74Na perspectiva <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> história <strong>cultura</strong>l, as representações do mundo socialassinalam as formas simbólicas pelas quais os sujeitos constro<strong>em</strong>-no do modo como opensam, interpretam e desejam num universo plural de concepções. Os discursos sãoformulados conforme a apreensão e interesse extraídos <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de e designam umadetermina<strong>da</strong> postura frente ao mundo. Retratam a s<strong>em</strong>ântica do poder de submeter, resistir,transgredir ou de simplesmente compreender e explicar uma <strong>da</strong><strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de. Dessa forma, osdiscursos <strong>da</strong> Encuentro de la Cultura Cubana se delineiam por uma <strong>da</strong>s narrativas <strong>da</strong>socie<strong>da</strong>de <strong>cuba</strong>na, <strong>sob</strong>retudo pelos setores do exílio externo e interno (aquele que, apesar dese encontrar <strong>em</strong> seu território, o silêncio lhe é imposto) que li<strong>da</strong> com uma outra percepção<strong>sob</strong>re o esgotamento do regime político <strong>em</strong> Cuba e as novas expectativas de mu<strong>da</strong>nçascria<strong>da</strong>s.O enfoque <strong>cultura</strong>l não significa uma condição de neutrali<strong>da</strong>de para evitarqualquer posicionamento configurador de uma contestação política, seja de que âmbito for.Mas representa uma outra maneira de enfrentamento a um contexto histórico de autoritarismoe centralização do poder. Possibilita uma reflexão aplica<strong>da</strong> tanto a uma socie<strong>da</strong>de deexperiência capitalista, quanto socialista, guar<strong>da</strong><strong>da</strong> as especifici<strong>da</strong>des do processo histórico deca<strong>da</strong> uma delas, pois não está <strong>em</strong> cena um grande movimento articulado <strong>sob</strong> a vanguar<strong>da</strong> departidos políticos, mas um espaço onde expectativas individuais e coletivas são traduzi<strong>da</strong>s <strong>em</strong>diferentes linguagens, a artística, acadêmica e popular que somam no processo dediferenciação <strong>da</strong>s transformações políticas.Neste sentido, torna-se um caminho politicamente subversivo, pois pretende que a<strong>cultura</strong> seja o espaço para que as diferenças se exponham livr<strong>em</strong>ente e seja a referência deuma luta que a faça ser compreendi<strong>da</strong> como anterior, concomitante e posterior a um projetopolítico de poder. Não se entende aqui uma condução <strong>cultura</strong>l linear, pois mesmo <strong>em</strong> suastransformações que lhe são próprias, a <strong>cultura</strong> propicia à socie<strong>da</strong>de caminhar de maneiraautônoma, resistir aos mecanismos do poder e não se sucumbir aos mesmos.A presença de uma <strong>cultura</strong> que faz a conexão entre passado e presente <strong>em</strong>processo constante de transformação, e a qualquer momento <strong>em</strong>erge de forma inespera<strong>da</strong>,contrastando a um contexto de homogenei<strong>da</strong>de política, pode ser observa<strong>da</strong> no artigo Losparadigmas perdidos: la manigua del significado de Alan West, poeta e professor <strong>cuba</strong>noresidente nos EUA. Para ele, é como se a <strong>cultura</strong> fosse um espectro a introduzir seu sentido<strong>em</strong> momentos mais antagônicos e nos advertisse para ressignificá-los. Diante <strong>da</strong>s forçaspolíticas que divid<strong>em</strong> a socie<strong>da</strong>de – revolução e exílio – “se encuentra la influencia mediadora
75de la <strong>cultura</strong> <strong>cuba</strong>na.” 95 Lança mão do termo manigua (o sentido literal <strong>em</strong> espanhol se referea um terreno úmido coberto por ervas <strong>da</strong>ninhas) no sentido metafórico <strong>da</strong> busca de um outrolugar, de retorno do “outro” neste momento de sua história, que na<strong>da</strong> mais é do que tudoaquilo que potencializa a <strong>cultura</strong> <strong>cuba</strong>na – orixás, el choteo 96 , a literatura, o ritmo, osincretismo. Esse é o ponto <strong>em</strong> que o paradigma do diálogo é argumentado e desafia omonolitismo político-<strong>cultura</strong>l. Alan West descreve <strong>sob</strong>re esse lugar, os el<strong>em</strong>entos <strong>cultura</strong>ispresentes nesse terreno e seu significado:La manigua presenta un matorral donde la significación penetra enprofundi<strong>da</strong>d y donde la historia se puede tragar completa para traerlanuevamente al propiciar la contingencia, el mito, la generosi<strong>da</strong>d, la m<strong>em</strong>oriay la metáfora. 97É <strong>sob</strong>re os referenciais <strong>da</strong> heterogenei<strong>da</strong>de, do sincretismo e <strong>da</strong> contradição que oautor procura traçar uma outra história de Cuba. Um diálogo que redefine a <strong>cultura</strong> e apolítica:...si una nación es como un ser, entonces no será estable, sóli<strong>da</strong> ypermanente sino que dependerá del diálogo, de los actos, del consenso y dela interpretación. 98En su intenso cuestionamiento de las ver<strong>da</strong>des estableci<strong>da</strong>s los <strong>cuba</strong>nos estánredefiniendo críticamente muchos términos: el de nación, el de historia, el declase, la <strong>cuba</strong>nía, y la relación entre el arte y la política. 99Nessa mesma direção <strong>em</strong> que as aparições <strong>cultura</strong>is interpenetram <strong>em</strong> momentosde crise política, Antonio Benítez Rojo 100 , estudioso <strong>da</strong> <strong>cultura</strong> caribenha e autor de La isla95 WEST, Alan. Los paradigmas perdidos: la manigua del significado. Revista Encuentro… Madrid. Primavera/ Verano de 1997. Vol.4/5. p.15696 Cf. Colección Pensadores Cubanos de hoy por Felix Valdés García. Del choteo <strong>cuba</strong>no a la ideia del GranCaribe. Disponível <strong>em</strong>: http://www.filosofia.cu/cont<strong>em</strong>p/fvg011.htm El choteo: expressão característica <strong>da</strong>identi<strong>da</strong>de <strong>cuba</strong>na que se origina <strong>da</strong> psicologia <strong>da</strong> <strong>cultura</strong> negra. T<strong>em</strong> como peculiari<strong>da</strong>de conduzir a vi<strong>da</strong> d<strong>em</strong>aneira leve, não encarar situações d<strong>em</strong>asia<strong>da</strong>mente sérias. Esta atitude diante <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> é trata<strong>da</strong> como estudofenomenológico por autores como Fernando Ortiz (Contrapunteo del tabaco y el azúcar, 1940) e Jorge Mañach(In<strong>da</strong>gación del Choteo, 1928) <strong>em</strong> que o vê<strong>em</strong> como mecanismo de escape à dominação. Trata-se de umcomportamento <strong>cultura</strong>l e político de carnavalização e ridicularização diante <strong>da</strong> opressão. A atuali<strong>da</strong>de dochoteo se encontra na criação do son a partir do século XX como música originária <strong>da</strong> guaracha, que abor<strong>da</strong>t<strong>em</strong>as como a mulata <strong>cuba</strong>na e crítica ao governo.97 Op. cit. p. 17198 Op. cit. p.15999 Op. cit. p. 161100 Antonio Benítez Rojo nasceu <strong>em</strong> 1931 e faleceu <strong>em</strong> janeiro de 2005. Logo após o triunfo <strong>da</strong> Revolução foinomeado diretor de Estatística do Ministério do Trabalho. Foi m<strong>em</strong>bro do Conselho Nacional de Cultura, RevistaCuba, chefe editorial <strong>da</strong> Revista Casa de las Américas e Centro de Estudos do Caribe. Em 1967 ganhou o prêmioCasa de las Américas pelo livro Tute de reyes que se transformou <strong>em</strong> filme Los <strong>sob</strong>reviventes <strong>sob</strong> a direção de
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