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A audiência de custódia na concepção da justiça gaúcha
jeitos presos ou detidos sejam colocados em uma casa prisional administrada
por colegas de quem efetuou as suas prisões. Mais que isso, dentro das
salas de audiência, a segurança é feita igualmente por integrantes da Brigada
Militar, o que só aumenta a sensação de desconforto e desconfiança do
sujeito preso ou detido em cumprir com uma das finalidades da audiência
de custódia, prevista – quem diria – na própria Resolução nº 1087/2015,
qual seja, que o sujeito privado em sua liberdade informe se foi alvo de
algum ato abusivo por parte das autoridades responsáveis por sua prisão. 15
Essa situação esdrúxula já foi, ao seu tempo, muito bem apontada
pela doutrina. 16 Mesmo assim, poderiam os defensores da realização da
audiência de custódia em casas prisionais de Porto Alegre afirmar que isso
não passa de uma posição alarmista por parte dos radicais defensores dos
direitos humanos. Para quem assim pensa, é preciso dizer que já há casos
em que sujeitos presos estão se negando a prestar informações ao juiz plantonista,
quando perguntados sobre o fato de haverem sido alvo de maustratos,
tortura ou algum tipo de agressão por parte dos policiais militares
responsáveis por sua prisão. E, o que é pior, tal negativa foi devidamente
gravada e registrada em mídia. 17
Ao fim e ao cabo, é o próprio Poder Judiciário gaúcho quem vem se
esforçando para que a audiência de custódia não alcance um dos objetos
por ela apontado em sua resolução, seja por determinar que esse ato se
realize em estabelecimento prisional administrado pela polícia militar estadual,
seja por lá manter esse mesmo ato, após estar ciente de que já há presos
se recusando a falar sobre os abusos sofridos durante a prisão. Por tal
15 Art. 4º. A audiência de custódia terá como objeto o exame da legalidade da prisão e da necessidade
da prisão cautelar ou a sua substituição por medida diversa da prisão, bem como
a prevenção à tortura e a qualquer tratamento desumano ou degradante, e, ainda, a atos
constitutivos de abuso de autoridade.
16 Nesse sentido, vale a reprodução integral da lição de Caio Paiva: “É inconcebível crer, por
exemplo, que o preso teria alguma condição, sem colocar ainda mais em risco a sua integridade
física e psíquica, de narrar a ocorrência de tortura ou maus-tratos praticados por policiais
estando dentro de um estabelecimento prisional, que em muitos lugares é administrado
por forças policiais ou por empresas de alguma forma ligadas ao setor de segurança pública”
(ob. cit., p. 55).
17 Auto de Prisão em Flagrante. Expediente nº 001/2.15.0071843-0. Juiz de Direito Volnei dos
Santos Coelho, audiência realizada em 06 de setembro de 2015.
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AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: DA BOA INTENÇÃO À BOA TÉCNICA