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Livro Democracia e Politicas Publicas Anticorrupcao FINAL

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

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CAPÍTULO 3 ACESSO À INFORMAÇÃO, DIREITO À MEMÓRIA E DITADURA MILITAR: O CASO DA CORRUPÇÃO AO LONGO DO REGIME DE 1964<br />

O relator, Sebastião Nery, e outros deputados, não conseguiram obter nenhuma informação do<br />

coronel nesse interrogatório, já que ele temia represálias à empresa na qual trabalhava.<br />

Dias depois, o coronel Dickson Grael, próximo de Saraiva, foi à CPI e contou o que o ex-adido o<br />

havia relatado. Depuseram ainda na CPI o ex-ministro Sylvio Frota, que recebera o relatório Saraiva, e o<br />

ex-adido militar em Berna, general Etchegoyen, que afirmou sobre atividades financeiras de brasileiros<br />

na Suíça: “comentava-se que um grande número de brasileiros possuíam contas sigilosas em diversos<br />

bancos suíços” e que o Crédit Suisse “tinha chegado ao requinte de decorar uma sala com motivos<br />

folclóricos da Bahia para agradar seus clientes brasileiros.”. Os assessores de Delfim também foram<br />

à CPI e José Maria Vilar de Queiroz, em seu depoimento, acusou Saraiva de “pigmeu moral” e Mariza<br />

Tupinambá de Oliveira de “mundana”. Tupinambá trabalhava no serviço cultural da embaixada e fez<br />

a intermediação entre Broissia e os diplomatas da representação, sendo por isso demitida por Delfim.<br />

Foi morar em Londres, sob a proteção do embaixador Roberto Campos, onde recebia mesada de £<br />

700 da Odebrecht, por ter ajudado em denúncia sobre a rival Camargo Corrêa 33 .<br />

Em 1984, Saraiva foi de novo à CPI e relatou o que sabia. Disse ter feito a denúncia ao ministro<br />

Shigeaki Ueki, que disse já saber. Relatou que os banqueiros franceses não aceitaram a proposta de<br />

Delfim em Tucuruí por considerar 6% uma comissão muito alta. Delfim não foi ao Congresso e afirmou<br />

que as acusações “não passam de calúnias” 34 .<br />

As denúncias de militares com informações de ilegalidades e contra o ministro datavam desde<br />

1968, quando o general Albuquerque Lima repassou a Médici, do SNI, denúncias que tinha recebido.<br />

Apesar das acusações, os ditadores Médici e Figueiredo mantiveram ou nomearam Delfim para o<br />

cargo de ministro.<br />

As irregularidades entre as empreiteiras não são um desvio no funcionamento do mercado de<br />

obras públicas, mas uma característica estrutural desse ramo de atividades, cujos desvios são os<br />

casos denunciados. Se houve acusações de aditamentos indevidos em obras e recepção de recursos<br />

por agentes do poder público e figuras intermediárias, a maioria das denúncias se dá na concorrência<br />

entre as construtoras. O recurso da acusação pública, na imprensa ou no Congresso é em si uma<br />

forma de competição ou retaliação de uma empreiteira contra outra, o que é particularmente comum<br />

a partir da abertura e no regime democrático.<br />

Uma forma de neutralização da concorrência e direcionamento do resultado no mercado de obras<br />

públicas era o “edital sujo”, ou concorrência dirigida. Na campanha pela “moralização das concorrências”,<br />

lançada nos anos 80, o presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção),<br />

Luís Roberto Andrade Ponte explicou o que era isso:<br />

33 GRAEL, Dickson M. Aventura, Corrupção, Terrorismo: à sombra da impunidade. Petrópolis: Vozes, 1985, p. 23-78.<br />

34 GRAEL, Dickson M. Aventura, Corrupção, Terrorismo: à sombra da impunidade. Petrópolis: Vozes, 1985, p. 23-78.<br />

DEMOCRACIA E POLÍTICAS PÚBLICAS ANTICORRUPÇÃO 44

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