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Livro Democracia e Politicas Publicas Anticorrupcao FINAL

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

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CAPÍTULO 4 JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO: O DIREITO DIANTE DAS MUDANÇAS POLÍTICAS<br />

e embates irrompem no espaço público com especial protagonismo, em “estado puro”, condensando<br />

o tempo histórico e ampliando os limites dos conflitos na definição dos destinos da coletividade.<br />

A vultosa dimensão das tarefas transicionais e a implicação profunda dos atores nelas envolvidos<br />

parecem compensar-se. Os desafios de influenciar os rumos das mudanças políticas atingem tanto<br />

os defensores do antigo regime quanto os arautos de uma nova ordem. São interesses e motivações<br />

de distintos níveis que determinam a posição dos atores políticos relevantes para o desenlace dos<br />

conflitos postos e institucionalizados.<br />

Ponto a ponto, a invenção – nem sempre democrática – das soluções políticas durante a sucessão<br />

entre regimes pode ser pactuada com ampla margem de liberdade, a depender essencialmente<br />

apenas dos sujeitos envolvidos e de suas demandas, desde as mais imediatas e pragmáticas – como<br />

a não punição dos que estão deixando o controle do Estado – como as mais ideológicas envolvendo<br />

diferentes visões de mundo e projetos de país. Em suma, em um cenário de suspensão das regras<br />

que estavam estabilizadas no antigo regime e ainda sem diretrizes claras sobre como será o futuro,<br />

tudo parece restar à livre negociação e à força performativa da ação política.<br />

Nesse cenário, o direito era tomado como aspecto secundário, relegado a um segundo plano.<br />

Com suas tradicionais funções de conservação e estabilização das ordens sociais, subestimava-se<br />

sua capacidade de pautar e influenciar também as transformações políticas. No entanto, o estudo do<br />

direito, pensado normalmente para períodos de estabilidade política, não é menos relevante do que a<br />

perspectiva que privilegia a dimensão política da transição. Com efeito, o funcionamento ordinário e<br />

a estabilidade característica e até estruturante do direito em tempos de normalidade não persistem<br />

diante das profundas modificações políticas a que estão sujeitas as sociedades.<br />

Aliás, essa visão que veiculava uma inevitável distância e até mesmo uma contraposição entre<br />

processos de transição política e o direito afastaram tais questões do centro de preocupações das<br />

ciências jurídicas. Não demorou, contudo, para que se percebesse que o papel do direito não é menor<br />

nesses processos: longe de ser apenas afetado passivamente, ele influencia e retroalimenta, com suas<br />

especificidades, os estímulos transicionais, marcados por constantes fases de inflexões e inovações<br />

nos procedimentos e instituições já tradicionalizados.<br />

Com efeito, esse papel ativo do direito é potencializado com a internacionalização dos campos<br />

jurídicos, em especial no campo da defesa e da promoção dos direitos humanos. Com a globalização<br />

que se acentua no final do séc. XX, diversos deveres consagrados na ordem internacional funcionam<br />

como complementos aos poder normativo dos Estados-Nação, traçando alguns parâmetros limitadores<br />

não só da atuação regular destes perante seus cidadãos nos momentos ditos de normalidade, mas<br />

também nos tempos de exceção e de transição políticas.<br />

Deslocam-se, assim, as linhas de força determinantes das transições do campo da política para<br />

o do direito. As revisões e anulações de diversos acordos políticos de transição, anos e até décadas<br />

após a celebração dos mesmos, atesta exatamente essa nova situação. Isso pode ocorrer tanto pelas<br />

Cortes Supremas como pelas jurisdições regionais e internacionais.<br />

DEMOCRACIA E POLÍTICAS PÚBLICAS ANTICORRUPÇÃO 50

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