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Livro Democracia e Politicas Publicas Anticorrupcao FINAL

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.

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CAPÍTULO 6 O DARDO E O ALVO: MINISTÉRIO PÚBLICO E ACCOUNTABILITY<br />

Esse era o modelo do Ministério Público brasileiro até a Constituição de 1988. Os promotores<br />

e procuradores, tanto em nível estadual quanto federal, respondiam, em última instância, aos governadores<br />

e ao presidente da República. O Ministério Público Federal, inclusive, exercia as funções que<br />

hoje são desempenhadas pela Advocacia Geral da União (AGU), braço jurídico do Poder Executivo<br />

Federal criado pela Constituição de 1988. Foi somente a partir da promulgação da Carta que marca<br />

a transição democrática que o órgão encarregado da ação penal se tornou autônomo em relação a<br />

todos os Poderes de Estado e teve suas atribuições significativamente ampliadas.<br />

O Ministério Público, embora tenha recebido muita visibilidade por sua atuação no combate<br />

à corrupção nos últimos, especialmente após os escândalos políticos conhecidos como Mensalão e<br />

Operação Lava Jato, não recebeu dos constituintes significativas doses de autonomia por causa disso.<br />

O novo Ministério Público nasce, na verdade, como uma instituição autônoma, distante da ingerência<br />

dos políticos, principalmente para fiscalizar a observância dos inovadores direitos sociais e coletivos<br />

previstos na Constituição de 1988. Durante os debates, a preocupação sobre a corrupção aparece de<br />

forma secundarizada nas falas e sugestões dos constituintes (KERCHE, VIEGAS, no prelo).<br />

O que ocorreu, na verdade, foi que frente ao diagnóstico de uma sociedade hipossuficiente, incapaz<br />

de cuidar de seus direitos por conta própria (ARANTES, 2002), somada à incerteza sobre o compromisso<br />

dos futuros governantes em relação a esses novos direitos, promotores e procuradores altamente insulados,<br />

protegidos de ingerências externas e de pressões políticas, receberam a incumbência de cobrar a<br />

observância dessas novidades constitucionais. Assim, o Ministério Público colaboraria para transformar<br />

a saúde, educação, preservação do meio ambiente e do patrimônio histórico etc. em prioridade nas<br />

administrações espalhadas pelo país. Isso, obviamente, se refletiu na atuação do órgão. Nos anos 1990,<br />

após a promulgação da Constituição, o “protagonismo pela inclusão” foi a marca do Ministério Público,<br />

e não o combate à corrupção como se deu nos anos 2000 (MARONA, BARBOSA, 2018).<br />

Essa autonomização prevista a partir de 1988 consiste em assegurar, por meio de uma série<br />

de instrumentos institucionais, que o Ministério Público, que passa a constar em Capítulo à parte em<br />

relação ao Poder Executivo na Constituição, não fosse um órgão subordinado ao governo. Esse novo<br />

modelo, bastante incomum em perspectiva comparada, suscitou até debates se o Ministério Público<br />

seria o quarto Poder da República (ARANTES, 2002).<br />

Essa independência é assegurada principalmente por meio de dois instrumentos. O primeiro é<br />

a autonomia funcional, administrativa e, até certo ponto, financeira em relação ao Poder Executivo. Se<br />

antes o Ministério Público era subordinado ao governo e dele dependia o seu orçamento e a autorização<br />

de iniciativas administrativas internas, a partir da Constituição de 1988 o órgão passa a controlar com<br />

autonomia muito mais expressiva esses aspectos de seu funcionamento.<br />

A segunda medida que assegurou altas doses de autonomia ao Ministério Público é que a<br />

chefia do órgão Federal e dos estaduais passou a ser exercida exclusivamente por um integrante<br />

DEMOCRACIA E POLÍTICAS PÚBLICAS ANTICORRUPÇÃO 83

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