Livro Democracia e Politicas Publicas Anticorrupcao FINAL
A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.
A obra reúne 10 capítulos escritos por especialistas no tema e é resultado de um curso homônimo desenvolvido por estas organizações em 2023, com o propósito de capacitar jornalistas, ativistas, servidores públicos e membros de organizações da sociedade civil do Brasil.
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
CAPÍTULO 5 ACCOUNTABILITY E CONTROLE DEMOCRÁTICO DO PODER JUDICIÁRIO NO BRASIL<br />
portanto, no sentido de que a grande maioria das suas sanções são impostas por órgãos estatais,<br />
como o próprio Poder Judiciário (e.g., conselhos, corregedorias) e/ou outros poderes do estado (e.g.,<br />
comissões parlamentares de inquérito, controle de execução orçamentária pelo executivo, auditorias<br />
realizadas por tribunais de contas). No entanto, como será frisado nas próximas seções, diferentes<br />
iniciativas de fiscalização podem ter origem fora do estado, por meio de reclamações, notícias de<br />
fato, reportagens jornalísticas etc. – e, nesses casos, há a possibilidade de uma sanção de natureza<br />
reputacional ocorrer diretamente entre os cidadãos e os magistrados.<br />
A terceira qualificação é que a accountability judicial abarca tanto a “atividade-fim” como<br />
as diversas “atividades-meio” do Poder Judiciário. Por “atividade-fim” do Poder Judiciário em uma<br />
democracia liberal, entenda-se a resolução pacífica e imparcial de conflitos por meio da interpretação<br />
exigível da legislação (DA ROS e TAYLOR, 2019). Este é, em outras palavras, o mandato principal ou<br />
missão institucional conferido pelos cidadãos e pelas demais autoridades políticas ao Poder Judiciário<br />
e aos seus membros. Essencialmente, isso abarca as decisões e não-decisões judiciais de responsabilidade<br />
dos magistrados. Accountability judicial diz respeito, assim, às alegações de corrupção,<br />
potenciais conflitos de interesse, ineficiência, incompetência e outras formas de abuso cometidas por<br />
magistrados no exercício da atividade jurisdicional. Pensando apenas em casos que envolvem alegação<br />
de corrupção, ilustram a accountability judicial em relação à atividade-fim do Poder Judiciário casos<br />
como o do ex-juiz federal de São Paulo, João Carlos da Rocha Mattos, alvo da Operação Anaconda, de<br />
2003, condenado por venda de decisões judiciais, assim como o da desembargadora Maria da Graça<br />
Osório Pimentel Leal, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), acusada também de venda de decisões<br />
judiciais no âmbito da Operação Faroeste, de 2019.<br />
Mas, como dito acima, a accountability judicial engloba também todas as “atividades-meio”<br />
realizadas pelo Poder Judiciário, que devem ser vistas como viabilizadoras da realização do mandato<br />
principal ou missão institucional do Poder Judiciário discutidos acima. Isso inclui, por exemplo, a seleção<br />
e promoção de magistrados, assessores, servidores, terceirizados e estagiários (e.g., alegações<br />
de casos de favorecimento ou nepotismo), os processos de saída de pessoal (englobando a política<br />
de “porta giratória” que regula, por exemplo, o exercício da advocacia por ex-assessores ou por<br />
magistrados aposentados, ou o seu ingresso na atividade política, além de casos de exonerações por<br />
perseguição política) e toda a atividade de gestão que envolve, por exemplo, a celebração de contratos<br />
administrativos para construção de prédios e prestação de serviços (de informática, limpeza etc.),<br />
as decisões sobre verbas indenizatórias, a extensão e a existência de determinados serviços (e.g.,<br />
motoristas), entre diversas outras decisões de natureza preponderantemente administrativa tomadas<br />
pelo Poder Judiciário. Novamente, pensando apenas em casos de alegação de corrupção, ilustram a<br />
accountability judicial em relação às atividades-meio do Poder Judiciário casos como o do ex-juiz do<br />
trabalho Nicolau dos Santos Neto, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em obra<br />
do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, e, mais amplamente, a “crise do nepotismo” que<br />
DEMOCRACIA E POLÍTICAS PÚBLICAS ANTICORRUPÇÃO 63