FICHA CATALOGRÁFICA D812e Duarte, Ana Helena da Silva ...

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Diante da necessidade real de fazer uma cirurgia de urgência, Orlan tirou partido
da situação e filmou sua primeira performance, como se fosse uma atitude planejada. A
partir de então, ela afirma ter a certeza de que pretendia trabalhar a cirurgia outras
vezes.
A artista já se submeteu a doze cirurgias plásticas performáticas, que normalmente
são transmitidas ao vivo por redes de vídeos, instalados em pontos determinados. São
gravados, servindo como documentação, posteriormente trabalhados pela artista. Tratase
de um poderoso material de denúncia. 171
A Body Art é também uma maneira de desfetichar o corpo humano. Uma forma de
dizer não a toda exaltação da beleza que a pintura, a escultura e a literatura passaram
séculos cultuando. Discurso que engendrou fortemente no imaginário do homem. Seus
resquícios vigoram até hoje, provocando um estranhamento em muitos espectadores,
limitando-os de receber a arte contemporânea.
Quebrando tabus, desalienando o corpo da distancia de si mesmo, reensinando um
corpo quase mudo a falar, provocando suas complexidades semióticas, o “performer
agride o corpo” como se fosse uma tortura, para extrair desse momento de limite, uma
confissão guardada em seu inconsciente. Seria
também uma forma de exteriorização, de
medir resistências, de desvelar pudores, de
desalienar o corpo de si próprio. Descobrir
possíveis identidades (fig. 86).
Nesse sentido, Orlan conta-nos uma
FIGURA 86 - Performance da artista Orlan
pequena fração de processo criativo: foi numa
FONTE: www.cicv.fr/creation, 2002.
leitura do texto de Eugenie Lemoine-Luccioni,
uma psicanalista lacaniana, que surgiu a idéia de colocarmos isso em ação. No
começo de toda nossa operação performática , líamos esse trecho do livro La Robe:
[...] Há uma má troca nas relações humanas porque, um nunca é o que um tem [...]. Eu
tenho a pele de um anjo, mas sou um chacal... a pele de um crocodilo, mas sou um
cachorrinho, a pele de um negro, mas sou uma branca, a pele de uma mulher, mas sou
homem. Eu nunca tenho a pele do que sou. Não há exceção para a regra porque eu
nunca sou o que eu tenho. 172
171 HILL, Marcos. O Retrato na Pintura I. Texto apresentado à Semana de Estudos da UFMG sobre a
pintura – conceitos e conservação. Belo Horizonte: 2001.
172 Texto disponível em www.civc.fr. 07/04/2002. Tradução: Mariana Duarte.