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Diversidade na educação : reflexões e experiências - Cereja

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No que concerne à produção de sentidos da escolarização, há por sua vez dois<br />

problemas a serem considerados, por seu entranhamento profundo no processo<br />

pedagógico. O primeiro pode ser enunciado em termos de a <strong>educação</strong> escolar ser exóge<strong>na</strong>,<br />

estranha à tradição cultural de todos os grupos. Imposta ou conquistada, a <strong>educação</strong><br />

escolar tor<strong>na</strong>-se foco de produção de sentidos exógenos.<br />

Há grupos com falantes bilíngües e falantes monolíngües (que falam<br />

exclusivamente uma língua, a língua do grupo ou a língua portuguesa), grupos que<br />

perderam a própria língua, mas são falantes de uma variação da língua semantizada pela<br />

cultura grupal. Num outro caso, de modo mais ou menos radical, todos esses grupos têm<br />

uma vivência de diversidade cultural, dispondo de uma linguagem própria, de um “idioma<br />

cultural” semantizado pelas <strong>experiências</strong> vividas <strong>na</strong> diversidade e <strong>na</strong> adversidade,<br />

enquanto grupo socialmente diferenciado.<br />

O aprendizado da língua portuguesa aparece aos mais jovens como promessa de<br />

facilitação <strong>na</strong> resolução das tensões, dos problemas do contato e como uma espécie de<br />

passaporte de inclusão social, acedendo aos bens da cultura domi<strong>na</strong>nte.<br />

A concepção de fundo implícita ou explícita <strong>na</strong>s falas de lideranças, de mulheres<br />

e homens índios, jovens e adultos que já tive oportunidade de ouvir é da <strong>educação</strong> escolar<br />

como instrumento de emancipação étnica, como ferramenta útil e necessária à redefinição<br />

do contato, configurativa de uma nova correlação de força, fortalecendo-os nos conflitos<br />

de interesse, reorientando conceitual e praticamente as suas relações com a fração local<br />

e regio<strong>na</strong>l da sociedade <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e com as agências gover<strong>na</strong>mentais no sentido de<br />

superação da ideologia da integração assimilacionista ainda tão persistente.<br />

A <strong>educação</strong> escolar como um vetor de empoderamento, um instrumento de<br />

orientação no emaranhado de organizações e agências, uma alavanca <strong>na</strong> ampliação de<br />

possibilidades de recursos, de melhor aproveitamento de oportunidades. Entendem que<br />

leitura e escrita são chaves com que podem mais facilmente destrancar portas, desatar<br />

nós, apreender nexos, enfim, transitar com mais desenvoltura pelos desvãos da organização<br />

jurídico-burocrática que se lhes apresenta como caixa preta impenetrável.<br />

Essa visão instrumental de dentro para fora não leva em conta, todavia, a força<br />

formante da oralidade e da escrita. Por isso é oportuno considerar as <strong>reflexões</strong> de Walter<br />

Ong (1982) sobre oralidade e escrita. Ong distingue entre o pensamento e sua expressão<br />

<strong>na</strong> cultura oral e o pensamento e sua expressão <strong>na</strong> cultura escrita.<br />

Para ele, o pensamento <strong>na</strong> cultura oral é formulaico, operado através de fórmulas<br />

fixas agregáveis, combináveis e recombináveis, sendo portanto mnemônico, comum (não<br />

individualizado). É um pensamento cuja metáfora pertinente é o cadeidoscópio em<br />

movimento6 .<br />

6 Lévi-Strauss (1996) já anteriormente havia lapidado a metáfora da bricolage, largamente utilizada por autores<br />

de diferentes discipli<strong>na</strong>s.<br />

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