12.07.2015 Views

universidade federal do rio grande do sul instituto de filosofia e ...

universidade federal do rio grande do sul instituto de filosofia e ...

universidade federal do rio grande do sul instituto de filosofia e ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

162numa experiência <strong>de</strong> conhecimento, em que a amiza<strong>de</strong> acabou seconstituin<strong>do</strong>, como no Mito <strong>de</strong> Teseu e o Minotauro, no fio <strong>de</strong> Ariadne paraminha penetração no universo nebuloso <strong>do</strong> outro. Edilene foi a arquiteta <strong>do</strong>spontos <strong>de</strong> observação que me levaram, poste<strong>rio</strong>rmente, a concentrar apesquisa em Jardim Veneza. Neste nosso longo convívio <strong>de</strong> empregada epatroa, conheci uma mulher que, segun<strong>do</strong> os meus padrões, era o protótipo<strong>do</strong> sofrimento e <strong>de</strong> submissão feminina 96 . Sempre manteve <strong>do</strong>is empregospara po<strong>de</strong>r sustentar a casa, pois Tonho, seu mari<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>rava quetrabalhar por uma miséria não valia a pena. Entretanto, um <strong>do</strong>s empregosmantinha em segre<strong>do</strong>, para que “ele não abocanhe tu<strong>do</strong> que eu ganho”.Muitas vezes chegava na casa com as marcas <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>sentendimentoscom o mari<strong>do</strong>. Certa vez, quebrou a perna e, mesmo assim, não aceitou osdias <strong>de</strong> repouso. Passa<strong>do</strong>s cerca <strong>de</strong> 15 dias, chegou na minha casamancan<strong>do</strong>, sem gesso, com olho roxo e pé quebra<strong>do</strong> em um novo lugar.Nessas horas, como diz uma amiga minha, a gente “põe a antropólogano freezer” e pára <strong>de</strong> relativizar o universo cultural <strong>do</strong> outro. On<strong>de</strong>, eu meperguntava, estavam as vantagens <strong>do</strong> casamento <strong>de</strong> Edilene? Fiqueichocadíssima e sugeri que ela po<strong>de</strong>ria ter um espaço na nossa casa paraseparar-se <strong>de</strong> Tonho. “Vou separar <strong>de</strong>le sim, mas não <strong>de</strong>ixo minha casa, não.É tu<strong>do</strong> que tenho na vida“.Edilene passou, então, a me <strong>de</strong>ixar saber que tinha se separa<strong>do</strong>,contan<strong>do</strong> inclusive histórias elaboradas sobre o estigma <strong>de</strong> ser uma mulhersem mari<strong>do</strong>. Por exemplo a história concernente a uma menininha queEdilene quase a<strong>do</strong>tou. Uma tragédia havia tira<strong>do</strong> a vida <strong>de</strong> sua prima e estahavia <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong> órfã uma menininha <strong>de</strong> três anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. Pensan<strong>do</strong> quepo<strong>de</strong>ria ser essa sua oportunida<strong>de</strong> para finalmente alcançar o status <strong>de</strong> mãe,ofereci to<strong>do</strong> o apoio para que ela criasse a menina. Já estava procuran<strong>do</strong> umacreche para inscrever a menina quan<strong>do</strong> Edilene me contou que uma tiamaterna havia chega<strong>do</strong> da Bahia e “carrega<strong>do</strong> com a menina”: “Ela me disse96Gregori (1992) redimensiona o discurso das queixas das mulheres vítimas <strong>de</strong>espancamento por seus mari<strong>do</strong>s, mostran<strong>do</strong> que as agressões são peças constitutivas<strong>de</strong>sses relacionamentos.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!