universidade federal do rio grande do sul instituto de filosofia e ...
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190meu patrocínio, estava mais farta. Na hora <strong>do</strong> almoço, o reconhecimento dahierarquia reservava-me um lugar na minúscula mesa ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong> SeuNorberto. Já Edilene e Edinha, juntamente com as crianças, comiam no chão.É claro que somente eu e meu filho recebíamos talheres.Não <strong>de</strong>vemos ler este relacionamento <strong>de</strong> maneira extremamentepragmática, tampouco exagerar na maquilagem romântica da situação.Aproveitar as oportunida<strong>de</strong>s que minha presença no bairro favorecia não setratava <strong>de</strong> um cálculo matemático e f<strong>rio</strong>. Assemelhava-se melhor ao que DeCerteau (1994) propõe como o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> táticas – atitu<strong>de</strong>s frente acertas ocasiões, quan<strong>do</strong> as relações <strong>de</strong> força <strong>de</strong> um relacionamento nãopo<strong>de</strong>m ser claramente calculadas. Os praticantes das táticas não têm controleda situação por inteiro, diferentemente daquele que emprega a estratégia.Através das táticas, as pessoas movem-se <strong>de</strong> maneira insinuada, num jogo <strong>de</strong>aparição e sombra com o movimento <strong>do</strong> outro, não dispon<strong>do</strong> <strong>de</strong> umaavaliação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os ganhos que a operação po<strong>de</strong> trazer 109 .Assim interpreto as lembranças e esquecimentos quanto ao meu status<strong>de</strong> patroa no bairro: como táticas usadas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um jogo, no qual algunslances não estavam <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início. Muitas vezes meu lugar eraimediatamente recupera<strong>do</strong>, às vezes para sublinhar minha “dignida<strong>de</strong>supe<strong>rio</strong>r” – como quan<strong>do</strong> me apresentavam na Igreja como visitante ilustre ousuportavam minhas visitas em horas ina<strong>de</strong>quadas, às vezes para me forçar<strong>de</strong>monstrações <strong>de</strong> dádivas, as quais o public transcript <strong>de</strong> nossas relaçõesprescrevia. Não eram estratagemas para explorar a “otária”. A possibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> eu oferecer alguma coisa, como disse acima, ou já estava prescrita nasregras <strong>do</strong> jogo entre subalternos e patrões, ou as pessoas <strong>do</strong> bairroaproveitavam uma situação pouco <strong>de</strong>finida para angariar algum proveito.Mas houve instantes – muito breves – em que fui colocada entre osiguais, quan<strong>do</strong> o roteiro público foi, por momentos, esqueci<strong>do</strong>: quan<strong>do</strong> Edilene109 Ver as <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> tática e <strong>de</strong> estratégia na introdução <strong>de</strong>sta tese.