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universidade federal do rio grande do sul instituto de filosofia e ...

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194Uma família emprega<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> Edilene (<strong>do</strong> meu círculo <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>s)resolveu que seus “carregamentos” haviam passa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s limites e resolveram<strong>de</strong>miti-la. A patroa, constrangida pela situação, preferiu passar o ato <strong>de</strong><strong>de</strong>missão para o esposo. Este, ao anunciar-lhe o fim <strong>do</strong> contrato e acertarto<strong>do</strong>s os pagamentos <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s, procuran<strong>do</strong> esclarecer as coisas, perguntoulhe:“Edilene, você sabe por que estamos dispensan<strong>do</strong> seus serviços? Porquevocê roubou dinheiro que estávamos juntan<strong>do</strong> para nossa filha.” Edileneretrucou que era impossível ela ter cometi<strong>do</strong> tal furto, uma vez que elespróp<strong>rio</strong>s haviam quebra<strong>do</strong> o cofre on<strong>de</strong> o dinheiro se encontrava. O patrãocompletou: “A gente sabe que foi você. Jurema, em seu trabalho, mostra quetodas as empregadas roubam”. Edilene, ofendida, <strong>de</strong>sferiu-lhe o único golpeque possuía lembran<strong>do</strong> ao patrão que ele também vem <strong>de</strong> uma origemhumil<strong>de</strong>: “Exatamente como tua mãe, não é? Ela não trabalha até hoje como<strong>do</strong>méstica?” 113 . São em breves situações como estas que os códigosencobertos <strong>do</strong>s relacionamentos <strong>de</strong>scortinam a encenação enganosa.Este episódio é ilustrativo <strong>de</strong> quão perigoso é para os subalternosexplicitar suas táticas encobertas e explica <strong>de</strong> maneira exemplar porque oenfrentamento direto geralmente não é interessante. Edilene, embora tenharetira<strong>do</strong> sua espada da cinta neste enfrentamento com seu patrão, logoretornou ao evitamento habitual. Não voltou para cobrar seus direitostrabalhistas, como não contou para sua família que havia si<strong>do</strong> <strong>de</strong>mitida,mentin<strong>do</strong> que estava <strong>de</strong> férias.Neste mesmo senti<strong>do</strong> (<strong>de</strong> <strong>de</strong>smascaramento <strong>do</strong> roteiro público), uma dascenas mais revela<strong>do</strong>ras das quais participei ocorreu na minha segunda noiteem Jardim Veneza, quan<strong>do</strong> Edilene levou-me a visitar as amigas que eu ainda113 Esse episódio me foi conta<strong>do</strong>, em primeira mão, pela própria Edilene que, emboraressentida, esperou meses até que eu voltasse para Vitória para saber se eu dizia realmentetu<strong>do</strong> isso no artigo. Depois <strong>de</strong> lermos juntas o trabalho, perguntei-lhe por que havia <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong>me receber em sua casa, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>. “Eu pensei em me vingar <strong>de</strong> você”, explicouEdilene. “Pensei assim. Tomara que eu acerte na Tele-Sena. Aí eu comprava um cartãotelefônico <strong>de</strong> 50, sabe? Ligava pra você e pedia para você vir se hospedar aqui em casa. Equan<strong>do</strong> você chegasse eu tinha i<strong>do</strong> embora para a Bahia”.

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