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(reconheceu também a voz de um filho) vindas de muitas direções. Ia responder com<br />

um "Aqui", ou "Aqui d'El Rei!" ou "Acudam", mas, movido ou por orgulho ou por uma<br />

grande saciedade, preferiu calar-se. Também, responder o quê? Ridiculamente: "Estou<br />

aqui em algum ponto do universo escuro!" riu para si. E enquanto os gritos se sucediam,<br />

dr. Roberto sentou-se na escada calmamente e encostou a cabeça na parede, tomado de<br />

uma paz novíssima para ele, que já conhecera todos os sentimentos possíveis. Ele via,<br />

como numa tela gigante de sua memória, os momentos fundamentais do país, onde ele<br />

estava sempre, sempre presente. E rostos de presidentes, de magnatas, de<br />

revolucionários, de artistas, tantos, tantos se somavam, um saindo de dentro do outro<br />

como uma trucagem genial do departamento de computer graphics, como ele vira há<br />

pouco tempo no clipe do Michael Jackson. Ali no escuro, uma grande alegria o possuiu.<br />

Era realmente um grande artista. Que criador havia moldado uma realidade como ele?<br />

Quem criara o infinito muro de maravilhas coloridas que ele acendia em 50 milhões de<br />

lares cada noite? Quem criara um mundo paralelo que existiria enquanto houvesse éter,<br />

substituindo a realidade como um plasma colorido? E, sem nenhuma onipotência, dr.<br />

Roberto sentiu o orgulho feito de uma humildade concreta, densa como a noite negra<br />

que o envolvia. E continuou a descer pelos degraus que mais doces ficavam. Fechando<br />

os olhos (para quê?) ouvia deliciado os ruídos somados de milhões de emissões de<br />

televisão que promovera em tantos anos, e tudo parecia uma imensa sinfonia, uma<br />

galáxia se parindo em luz como uma espécie de alma da realidade. Isto: ele criara uma<br />

espécie de alma para a realidade brasileira.<br />

Agora os chamados cios amigos e contínuos não se ouviam mais. E também a<br />

nuvem luminosa de programas se esmaeceu porque ele ouviu um ruído concreto. Era<br />

um ruído como água, como o suave rolar de marolas. O próprio silêncio adquiria uma<br />

ressonância cava, ampliado pela presença líquida. Cuidadosamente, ele tateou a última<br />

pedra do degrau e logo a seguir seus sapatos foram encobertos por água. Água, como a<br />

água do clube de remo da juventude, água mansa e trêmula de borda de cais. Ele<br />

estranhou aquele chão líquido e pensou que o acidente com a emissora pudesse ser mais<br />

grave, talvez água de bombeiros inundando a garagem (incêndio?), talvez inundação do<br />

Rio (chovera?). Mas continuou andando em busca de uma saída, agora já com água<br />

pelas canelas, que lhe ensopava as calças do terno perfeito. Subitamente, surgiu à sua<br />

frente uma primeira imagem (uma imagem?), talvez menos que isso, talvez a idéia de<br />

uma imagem: uma fina lâmina menos negra, uma quase luz que lembrava, tão longe, os<br />

chuviscos das telas de TV quando acaba a programação e todos dormem para um novo

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