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O que mais impressiona o público é que a crueldade está banida da coisa. Não<br />

há no relato desses assassinos o prazer com o pânico da vítima. Interessa a eles o<br />

silêncio de depois. Odeiam os urros, os medos. Nilsen diz que não foi cruel ao<br />

esquartejar os mortos: "Houve tragédia na hora que a vida se foi. Depois não; são como<br />

coisas." Não há neles o exibicionismo dos monstros malvados. O monstro malvado que<br />

ostenta a crueldade extrema faz o elogio do Bem. Tanto é seu demonismo que ele<br />

homenageia a Bondade. Já o neocrime é uma terceira coisa. É o crime que não é o<br />

contrário do bem; o mal que não é uma transgressão. O mal banal. Chama-se de 'mal'<br />

por falta de outro nome.<br />

Os canibais americanos falam uma verdade profunda sobre a sociedade que<br />

todos teimamos em ignorar com nosso humanismo requentado: o fim da tragédia já<br />

aconteceu; os extermínios brancos (no Norte) e vermelhos (no Sul) já começaram. De<br />

um lado, temos os brancos crimes sem ódio, e de outro os Carandirus. (Vejam que<br />

ninguém foi indiciado — 111 mortos sem culpados.) De resto, a justiça militar<br />

contempla com tédio essa exigência arcaica da sociedade de pedir punição. "Que saco,<br />

esses bacanas metidos a humanistas... Vem pra cá!" É como se o extermínio na prática<br />

tenha virado uma necessidade social que só os chatos não compreenderam ainda, com<br />

sua literatura. Aumentam os crimes sem remorso. A frieza dos canibais-chiques e a dos<br />

exterminadores de massa se igualam. Milwaukee e Matupá. Não queremos reconhecer<br />

nossa crescente impiedade, nossa crueldade cool, e temos de disfarçá-la com um horror<br />

postiço, nós que somos criminosos sem crimes visíveis. Ou não é criminosa a ausência<br />

total de compaixão da classe dominante do Nordeste, por exemplo? Contemplamos<br />

coniventes o crime brasileiro com a mesma frieza que Dahmer organizou seu<br />

supermercado de corpos. Fingimos acreditar que haverá solução para o país, quando<br />

talvez tenhamos que planejar o futuro levando em conta o insolúvel.<br />

Fim da compaixão<br />

A sobrevivência moderna precisa do crime. A sobrevivência moderna precisa

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