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é que havia antes um Carnaval real e que hoje há um Carnaval virtual. Não; não é bem<br />

isso. O que interessa é que há um tal surphus de devassidão no país o ano inteiro, que<br />

quase se começa a desejar um Carnaval moralizado. Sou bem sem-vergonha, mas quase<br />

que os panoramas de nádegas se oferecendo viram uma redundância do país do ano<br />

todo. Que liberdade, que alegria é essa que ninguém tem durante o ano? Fascina-me<br />

pensar o que estas mulheres me prometem. Sexo infinito? Sexo total, êxtase absoluto?<br />

Alegria ontem e hoje<br />

O último grande momento da arte brasileira maior foi quando Joãozinho Trinta<br />

soltou os ratos e urubus na rua, com os mendigos e o Cristo embalsamado no lixo. Isso<br />

foi um momento épico de genialidade crítica, como o foi o seu outro momento do luxo<br />

paródico e desmesurado. Essas mulheres não estão fazendo manifesto político, como fez<br />

inconscientemente a Elvira Paga para o meu pai e meus olhos deslumbrados de volta ao<br />

futuro em 1950, sei lá eu.<br />

O Carnaval de antes era o resultado de uma alegria que ia crescendo pouco a<br />

pouco. Alegria que começava a se formar com as cigarras de dezembro (ao menos no<br />

Rio), crescia com os flamboyants e o céu azul durante os meses do verão, ressoava nas<br />

marchinhas e sambas de enredo decorados em janeiro, se antevia nas avenidas sendo<br />

enfeitadas e acontecia de repente em fevereiro, numa debandada de perfumes e<br />

serpentinas. Havia uma alegria comemorável no país.<br />

Antes, tínhamos a sensação de que se chegava a um Carnaval, que o Carnaval<br />

culminava alguma coisa. Construíamos um Carnaval; hoje o Carnaval chega pronto. O<br />

Carnaval era uma revelação, uma conquista; hoje, o Carnaval esconde qualquer coisa.<br />

Falta um certo minimalismo no Carnaval; perdeu-se a delicadeza do detalhe. Somos<br />

esmagados por uma avalancha de imagens e corpos nus, e vemos com espanto o<br />

desconforto das multidões nos blocos. Há qualquer coisa de calamidade pública no<br />

Carnaval de rua; há algo de desesperado em certas alegrias.<br />

Há um grande silêncio antes e depois do Carnaval. Para onde vai tanto sexo?<br />

Para onde vai tanta alegria depois? Devia restar, sobrar um pouco mais. O Carnaval<br />

virou mais um grande espasmo de exorcismo de tragédia que uma genuína celebração.

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