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pode ajudar" ou "minha rocinha" ou "meu pocinho seco".<br />

Pobres sem charme<br />

O nordestino não ajuda o entrevistador. Ele não coopera com a imprensa ou o<br />

cinema. Sua afasia não é épica, pensávamos, mesmo com os dois ou três mais<br />

politizados que repetiam slogans que a Liga Camponesa espalhara no sertão. O<br />

flagelado não é um humanista; ele não sabe da vida do lado de cá da câmera, pensava<br />

eu, ele não tem o contracampo do mundo, ele está em duas dimensões, e o céu branco é<br />

uma parede onde ele recorta sua figura chocha. Ele não sabe que sua vida é nosso<br />

horror. O flagelado não sabe que está perdendo. Para ele, o mundo é assim. De certa<br />

forma, eu sofria mais por ele mesmo. O flagelado estranha a nossa compaixão ingênua.<br />

Ele estranha que nos preocupemos com ele, pois sua ótica é magramente a mesma ótica<br />

do senhor de engenho, de que ele não vale nada. O flagelado não sabe por que gostamos<br />

dele. Nós, comunas dessa época, víamos no flagelado a suja bandeira do futuro, a<br />

ossada triste de onde ia se erguer a vingança, a nova vida. O flagelado era uma alegoria<br />

da injustiça. O flagelado era para nós uma metáfora de si mesmo, que renasceria com<br />

luta.<br />

O flagelado era nossa salvação.<br />

No entanto, diante da câmera não pintava nada. Só o vazio afásico do não, só<br />

os restos de um discurso humilde, puído, abobalhado.<br />

Foi então que chegamos na rua do Sol. Com esse nome grandioso, a rua do Sol<br />

não era nem rua. Era um beco sujo no fundo de uma favela a duas horas de João Pessoa.<br />

E entramos numa casa pequena, entre porcos e crianças. E de repente tudo aconteceu<br />

como uma explosão de luz, tudo ao mesmo tempo, como uma máquina perfeita.<br />

Arte na miséria<br />

Num canto da casa, um velho magro sem o braço direito tremia sentado num<br />

banco. Tinha barba branca, cor de tacho de cobre, cor de barro, e seus olhos eram duas

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