Download - Xtecnologias
Download - Xtecnologias
Download - Xtecnologias
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
— Que nada, Nelson, você é um craque!<br />
"Ainda tenho pão e um pouco de manteiga para lhe barrar por cima..." ou "Se<br />
você vir um sujeito tocando acordeom no chão da rua do Ouvidor, pode dar esmola que<br />
sou eu..." E aí contava as coisas, falando como escrevia: "Chegou o crítico para mim e<br />
falou que boas eram minhas peças profundas etc e tal... Falou que na Falecida eu<br />
empobreci minha linguagem... se ele soubesse o esforço que eu faço para empobrecê-<br />
la...."<br />
Brasília é Nelson puro<br />
"A poesia está nos fatos", dizia Oswald no Pau Brasil. A poesia de Nelson<br />
ficava ao rés-do-chão, na infinita riqueza da língua real, na recusa a qualquer laranjismo<br />
totalizante (já estou exagerando no meu laranjismo). Nelson odiava realidades não<br />
concretas, metáforas gasosas, metáforas gosmentas. Nelson inventou a antimetáfora no<br />
Rio enquanto Oswald a inventou em São Paulo. Nelson era um Oswald sem viagens<br />
nem cultura fina. Esta cultura impediu Oswald de sacar o Nelson, pois implicava com<br />
ele. Nelson não era politicamente correto, por isso estava livre para ver. Ler Nelson,<br />
principalmente das crônicas (O reacionário), as pequenas histórias de A vida como ela<br />
é, as peças pobres e suburbanas, é viajar pelo país, pelo passado e entender o presente.<br />
O Brasil já esteve mais para Glauber Rocha, durante os anos épicos da<br />
violência, da tortura, cio militarismo louco. Nunca o Brasil esteve tão Nelson Rodrigues<br />
quanto hoje em dia. Não é o caso Magri, por exemplo, um lancinante episódio de A vida<br />
como ela é. Esta dosagem de caricatura com tragédia que regeu o caso da Zélia e do<br />
Boto, com o adultério transcendendo a política, a piada sinistra do Alceni das bicicletas,<br />
tudo é Nelson. Uma viagem a Brasília mostra o trôpego, o manco, o ridículo da<br />
dignidade nacional no Congresso, nos lobistas, em tudo. O traço palhaço, circense, de<br />
Nelson nos retrata mais até que os sóbrios subtons ingleses de Machado. Só pelo<br />
entendimento do atraso, da sólida mediocridade de nossas cabeças, é que começaremos<br />
a saber o que nos acontece.