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eproduzem em miniatura a imagem das duas colunas que sustentam o templo, o céu,<br />

sei lá.<br />

As ânforas, apesar de pequenas, são bem maiores que os cacos à frente do<br />

mendigo, e estão para os ditos cacos, como as colunas estão para o mendigo.<br />

Também esses dois recipientes lembram os dois pés humanos decepados de um<br />

ser que estaria andando mas sumiu, sendo, junto com o vento desfocado da cabeça do<br />

homem, outra sugestão de um passar de tempo.<br />

Atrás do homem, as colunas e as paredes também parecem se carcomer em<br />

silêncio, denotando uma outra passagem do tempo, fazendo o reboco das colunas mudar<br />

como um campo de provas do inquietante fluir.<br />

Há duas portas ou entradas na foto; uma fechada a cadeado, outra, uma<br />

abertura para o céu, uma escada banhada de luz levando a uma esperança alada. Ambas<br />

não parecem ter serventia nem para o mendigo nem para Rimbaud.<br />

Os despojos à frente do vendedor estão abandonados, num desalento<br />

melancólico e, apesar de identificáveis (xícaras, sandálias, cajado), formam um conjunto<br />

semelhante a ossos, tíbias, objetos tumulares, que parecem fluir do homem como se<br />

fossem os restos de um despedaçamento, de uma amputação progressiva (as pernas do<br />

homem não são vistas). A imagem é de uma melancólica permissão para a dissolvência.<br />

Por mais desatento que fosse o gesto de Rimbaud ao bater a foto, houve uma<br />

escolha ali de todos os elementos listados acima. Rimbaud escolheu de propósito um<br />

tema absolutamente não-espetacular, não-pitoresco, pois certamente ali em volta do<br />

quadro devia haver belas cenas da enfeitiçada Abissínia, tais como cavalos, mascates e<br />

mulheres coloridas.<br />

A escolha destes despojos.foi proposital. Sua irrelevância fala de um nada, de<br />

um casual melancólico que encontraríamos em fotos de arte conceituai muitos anos<br />

mais tarde, tão banais como foi a escolha da Abissínia como pátria para o poeta.<br />

Rimbaud refaz neste instantâneo toda a sua obra cheia de tíbias e colunas,<br />

concentradamente. Ex: "Aluguem-me este túmulo branco de cal, com as linhas do<br />

cimento em relevo, bem longe no fundo da terra. (...) acima de minha sala subterrânea,<br />

as casas se erguem; a lama é vermelha ou negra. (...) Em outro nível estão os esgotos;<br />

dos lados, a espessura do globo. Talvez abismos de azul, poços de fogo (...) Eu sou o<br />

senhor do silêncio. Mas, por que uma aparência de respiradouro empalidece no canto da<br />

abóbada?"<br />

Há um forte suspense ali, como sentimos (décadas depois) na obra de

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