Download - Xtecnologias
Download - Xtecnologias
Download - Xtecnologias
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
vítima é o móvel do crime. O assassino quer a vítima, quer o corpo da vítima, não o que<br />
ela tem. Ele não mata para roubar algo. Mata para ter o cadáver. Nestes crimes, a vítima<br />
é desejada. Já a vítima brasileira é um estorvo que tem de morrer. A vítima americana<br />
dos canibais é a recompensa. As vítimas brasileiras são a sobra, não têm nenhum valor<br />
de troca, são desovadas em matagais, derretidas, afogadas, enterradas. No crime<br />
americano, o assassino quer ser reconhecido como sujeito. No crime brasileiro, tenta-se<br />
provar que não há sujeitos. A vítima brasileira não presta para nada. As vítimas dos<br />
canibais americanos ornamentam seus lares vazios.<br />
Dennis Nilsen diz num artigo canibal-chique em Vanity Fair que tanto ele<br />
quanto Dahmer eram muito sozinhos e que as vítimas lhes faziam companhia,<br />
preenchiam suas vidas. Diz que matavam sem nenhum ódio, matavam por um estranho<br />
amor canibal e um erotismo necrófilo. Na árida sociedade rica os canibais têm fome do<br />
outro, fome do semelhante, fome de irmão. O que nos espanta é a novidade da presença<br />
dos mortos na sala de jantar, na geladeira: a domesticação do horror. Nada de vampiros,<br />
cavernas góticas, noites de tempestades. O morto está no living, como uma visita. Como<br />
disse Nilsen: "Só matei insignificantes como eu. Sempre achei que nunca iriam reclamar<br />
meu corpo se eu morresse. Somos tão insignificantes como os pedaços de cadáveres que<br />
enfeitaram minha casa." Os criminosos transformaram suas vítimas em artigos de um<br />
supermercado americano com prateleiras organizadas, rotuladas, registradas. Tudo<br />
pronto para a chegada da polícia. Os canibais americanos querem a chegada da Lei com<br />
ânsias, querem o conforto da polícia. Há pouco um foi enforcado dizendo: "Matem-me<br />
sim, matem-me senão eu continuo meus crimes!" Eles têm orgulho da América. Nilsen<br />
acumulou corpos na esperança de ser apanhado e libertado daquela horrenda solidão<br />
com seus amantes silenciosos. Ele descreve a chegada da polícia como "o dia em que<br />
veio o socorro" (."the day help arrived' 1 ). A polícia o libertou de uma solidão alarmada<br />
e lhe dá a quente companhia da prisão. A polícia lhes dá a chance de falar sobre o país,<br />
por sua exposição de arte, seu vernissage de corpos que querem aperfeiçoar a vida<br />
americana. As casas de Dahmer e Nilsen são instalações, mausoléus de denúncias para<br />
que um dia alguém chegue e descubra aquele sinistro panteão de heróis caídos, como<br />
um antimonumento da vida americana.<br />
Ex-monstros do mal