Pensar o ambiente: bases filosóficas para a educação ambiental
Pensar o ambiente: bases filosóficas para a educação ambiental
Pensar o ambiente: bases filosóficas para a educação ambiental
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
na modernidade, não foi o resultado da descoberta de “verdades” científicas, mas<br />
de uma construção teórica orientada por um objetivo preciso: tornar possível o<br />
maior grau de controle e manipulação da natureza. Esta questão é fundamental. Se<br />
o conhecimento é uma construção, a intencionalidade que o orienta torna-se decisiva<br />
<strong>para</strong> avaliar sua pertinência. Ignorando a extrema complexidade da natureza,<br />
a perspectiva <strong>para</strong>digmática da modernidade operou um recorte, decretando que<br />
a totalidade da natureza devia ser pensada como uma máquina cujo dinamismo<br />
era sustentado, exclusivamente, por leis de determinação conhecíveis e redutíveis<br />
à lógica identitária. O sujeito ativo desse conhecimento e dominação – o homem<br />
– foi também pensado de maneira reducionista: um corpo pensado como máquina<br />
e uma consciência racional se<strong>para</strong>da dele. Convém insistir: todas estas concepções<br />
não resultaram de descobertas operadas pelas ciências modernas. Elas organizaram<br />
uma determinada perspectiva – Paradigma – fazendo possível o desenvolvimento<br />
das ciências modernas.<br />
Na perspectiva assim construída, o homem deixou de ser visto como integrado<br />
à natureza, passando a sê-lo como se<strong>para</strong>do dela e com ela mantendo relações de<br />
oposição e dominação, tanto com relação à sua própria natureza (o corpo, instintos<br />
e paixões), quanto à natureza externa, da qual era ignorada a dinâmica autopoïética.<br />
O processo de conhecimento, finalmente, foi igualmente mutilado, fazendo<br />
da ciência a única forma de conhecimento admissível, e o “experimento”, a única<br />
modalidade de experiência válida como fonte de saber. Legitimada pela fabulosa<br />
eficiência manipulatória que demonstrou no mundo da matéria, esta perspectiva<br />
reducionista fechou radicalmente a possibilidade de pensar a extrema complexidade<br />
da natureza e do ser humano, bem como das relações entre ambos, deixando o<br />
homem inerme <strong>para</strong> lidar com os evidentes processos de destruição da natureza e<br />
de autodestruição da espécie.<br />
Esses processos destrutivos e autodestrutivos tornaram evidente a unilateralidade<br />
da perspectiva hegemônica construída pelo <strong>para</strong>digma moderno, fazendo com<br />
que sua crítica tenha se tornado uma questão crucial 2 . Silenciada e marginalizada<br />
durante um longo período, dita crítica tornou-se contemporaneamente mais audível<br />
como conseqüência da convergência de dois processos: os consistentes sinais de<br />
1 Estes estratos, que Castoriadis denomina “primeiro estrato natural”, respondem efetivamente às leis da<br />
causalidade (causa eficiente) e permitem estabelecer relações de determinação e construir representações<br />
teóricas formalizáveis e matematizáveis. Sua forma de ser não esgota, contudo, a forma de ser extremadamente<br />
complexa do ser e da natureza. A perspectiva tornada hegemônica na modernidade, ao postular<br />
que a totalidade do real “deve” possuir esta forma determinada, se constitui numa perspectiva unilateral<br />
(Castoriadis, 1973).<br />
2 Utilizei aqui o conceito de <strong>para</strong>digma no sentido forte, designando o conjunto de concepções sobre o ser, o<br />
conhecer e o homem que organizam e ao mesmo tempo limitam o pensamento.<br />
140