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Pensar o ambiente: bases filosóficas para a educação ambiental

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idéia de tragédia grega, na medida em que aponta <strong>para</strong> a imitação da ação (mimeses),<br />

a narração catártica de feitos e eventos singulares os transforma em “História”, pela<br />

via da memória, o que lhes confere duração após seu acontecimento no mundo da<br />

vida mortal. A imortalidade que confere valor ao feito humano somente pode ser<br />

obtida através do feito heróico que transforma o ato mortal em objeto da narrativa,<br />

ou seja, que o transforma em história. Assim, através da história os humanos têm<br />

acesso à condição de imortalidade.<br />

Arendt nos mostra como a relação entre physis, existência humana e história<br />

se transforma na modernidade. Na passagem da antigüidade grega clássica, <strong>para</strong> o<br />

mundo romano e cristão, uma mudança importante acontece. Juntamente com a<br />

decadência do mundo clássico grego se perde em grande parte a noção de physis.<br />

Aparece então o conceito de natura, palavra romana aplicada à natureza que já não<br />

mais compartilha do sentido holístico da physis. O conceito de natureza moderno é<br />

herdeiro da concepção de natureza da civilização romano-cristã.<br />

A natureza no sentido romano-cristão, cuja tradução latina natura está na<br />

origem etimológica e cultural do nosso conceito de natureza, diferentemente da<br />

noção grega de physis, é desprovida de inteligência e vida, incapaz de ordenar seus<br />

próprios movimentos. A natura está submetida às leis que lhe impõem uma regularidade<br />

desde o exterior, ou seja, as “leis da natureza”. Quem regula as leis da<br />

natureza é uma ordem divina que está fora do mundo. O mundo natural não é mais<br />

um grande organismo vivo, um ser, mas uma coordenação de organismos, impelidos<br />

e destinados <strong>para</strong> um fim determinado por um espírito inteligente que lhe é exterior:<br />

o Deus Criador e Senhor da natureza. Os seres humanos, enquanto criados<br />

por Deus, passam a ser imortais, enquanto a natureza é mortal. Inverte-se aqui o<br />

modelo grego, onde a physis era eterna e a vida do indivíduo humano era mortal.<br />

Segundo Arendt, a idéia de natureza romano-cristã pre<strong>para</strong>, através dos séculos, o<br />

contexto cultural <strong>para</strong> a Revolução Industrial e sua cosmogonia de um Deus como<br />

relojoeiro da natureza.<br />

Diferentemente da experiência de contemplação da physis, na modernidade<br />

a relação com a natureza é marcada pela dúvida cartesiana. Está posto, <strong>para</strong> os<br />

modernos, a questão dos enganos dos sentidos 2 . Em Copérnico, por exemplo, a<br />

terra, ao contrário da evidência dos sentidos, gira em torno do sol. A invenção<br />

do telescópio por Galileu desmente o olhar da experiência sensível, fonte de erro<br />

e ilusão. A ciência moderna baseia-se no Experimento, que é uma pergunta for-<br />

2 Sobre a desconfiança dos sentidos e a busca de uma verdade sem enganos, ver neste livro o artigo de<br />

Mauro Grün sobre Descartes, um pensador fundamental na formulação filosófica do pensamento moderno.<br />

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