âdisposições para crer, disposições para agirâ: jovens de ... - Uece
âdisposições para crer, disposições para agirâ: jovens de ... - Uece
âdisposições para crer, disposições para agirâ: jovens de ... - Uece
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
104<br />
[...] embora ele seja meu pai, eu acho meio ignorante pra certas coisas Eu, às<br />
vezes, tento passar coisas que ele <strong>de</strong>ve saber e eu já sei... Eu quero ter futuro, sei<br />
lá... (Garota <strong>de</strong> 16 anos, 2º Ano do Ensino Médio, Manhã, Grupo Focal).<br />
Essas <strong>de</strong>clarações nos remetem ao pensamento <strong>de</strong> Lahire (2002) ao comentar<br />
que o universo escolar passa a predominar como “ponto <strong>de</strong> referência” <strong>para</strong> aqueles que<br />
obtêm sucesso nesse espaço social. De acordo com o autor:<br />
Depois, ao se confirmar o sucesso escolar, é o universo escolar que<br />
predomina e se torna o “ponto <strong>de</strong> referência” [...] É difícil não se irritar com<br />
seus pais quando são cada vez mais vistos pelos olhos <strong>de</strong> um outro<br />
universo, a partir <strong>de</strong> outras maneiras <strong>de</strong> dizer, <strong>de</strong> ver, <strong>de</strong> fazer e <strong>de</strong> sentir.<br />
(LAHIRE, 2002, p.44-45).<br />
A percepção construída pela jovem acerca do pai, ao consi<strong>de</strong>rá-lo “ignorante pra<br />
certas coisas” <strong>de</strong>monstra que ela passou a enxergá-lo a partir dos olhos <strong>de</strong> outro universo.<br />
Embora não possamos afirmar que as experiências incorporadas do passado vivido em<br />
suas vivências familiares sejam esquecidas, “Porque seus pais estão nela, através <strong>de</strong> todos<br />
os hábitos que ela construiu através das relações com eles [...]” (LAHIRE, 2002, p.45),<br />
novas disposições po<strong>de</strong>m ser assumidas por nossa interlocutora diante do mundo, dada a<br />
diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contextos vividos até então e outros ainda a serem experimentados fora do<br />
universo familiar e escolar.<br />
Ao longo <strong>de</strong>ste Capítulo procuramos discutir e compreen<strong>de</strong>r as disposições dos<br />
nossos entrevistados em relação à educação, à profissionalização e ao futuro expressas<br />
através <strong>de</strong> suas narrativas. A maioria dos estudantes <strong>de</strong> EJA expressaram a intenção <strong>de</strong><br />
concluir o Ensino Médio e <strong>de</strong> ingressarem em cursos universitários, apresentando<br />
disposições <strong>para</strong> <strong>crer</strong> na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso a certas profissões consi<strong>de</strong>radas <strong>de</strong><br />
prestígio. No entanto, percebemos que essas “disposições <strong>para</strong> <strong>crer</strong>” encontram dificulda<strong>de</strong>s<br />
<strong>para</strong> serem transformadas em “disposições <strong>para</strong> agir”, tendo em vista os vários problemas<br />
enfrentados por esses atores em seus percursos escolares que lhes inviabiliza o acesso a<br />
certos conhecimentos e informações socialmente valorizados e exigidos <strong>para</strong> a entrada<br />
nesses campos profissionais.<br />
Para os entrevistados do Ensino Médio, <strong>jovens</strong> da mesma faixa-etária<br />
apresentada pelos estudantes <strong>de</strong> EJA, o caminho até então percorrido parece apontar <strong>para</strong><br />
possibilida<strong>de</strong>s mais factíveis <strong>para</strong> seus projetos <strong>de</strong> futuro, consi<strong>de</strong>rando que apresentam<br />
trajetórias escolares mais regulares e uma maior familiarida<strong>de</strong> com as “leis” que regulam o<br />
acesso dos que postulam a entrada em campos que lhes são muitas vezes estranhos, como<br />
o campo universitário.