Antonio Donizeti <strong>da</strong> Cruzmais diferentes socie<strong>da</strong>des. O poema é o <strong>pr</strong>oduto de uma história e de umasocie<strong>da</strong>de, porém, a sua maneira de ser histórico é repleto de contradições. Opoema é uma "máquina" que gera a "anti-história", mesmo que o poeta não tenhaesse intuito. A operação poética constitui em uma inversão ou conversão do fluirtemporal. O poema não detém o tempo, o contradiz e o transfigura (1984a, p. 11).O poema, além de ser uma reali<strong>da</strong>de verbal, é também um ato, isto é, opoeta diz, e ao dizer, faz. Esse fazer é <strong>pr</strong>incipalmente um "fazer-se a si mesmo". A<strong>poesia</strong> não é só autoconhecimento, mas também é autocriação. Ela é a palavra do<strong>pr</strong>incípio, palavra de base, porém é palavra de desintegração, ruptura <strong>da</strong> analogiapela ironia, pela consciência <strong>da</strong> história, ou seja, consciência <strong>da</strong> morte. Emrelação ao diálogo <strong>da</strong> <strong>poesia</strong> moderna com a história, Octavio Paz salienta queesse diálogo se concretiza fun<strong>da</strong>mentalmente pela "consciência irônica <strong>da</strong>nossa condição mortal".Octavio Paz, em Signos em rotação, assinala que a história <strong>da</strong> <strong>poesia</strong>moderna é a de um descomedimento. A interrogação so<strong>br</strong>e as possibili<strong>da</strong>des deconcretização <strong>da</strong> <strong>poesia</strong> não é uma in<strong>da</strong>gação a respeito do poema, mas <strong>da</strong>história. Os poetas do século XIX e <strong>da</strong> <strong>pr</strong>imeira metade do atual, aclamaram apalavra com a palavra, cele<strong>br</strong>aram-na até mesmo ao negá-la. Esses poemas nosquais a palavra volta-se so<strong>br</strong>e si mesma são irrepetíveis. Octavio Paz aponta parauma questão fun<strong>da</strong>mental:Que ou quem pode nomear hoje a palavra? Recuperação <strong>da</strong>outri<strong>da</strong>de, <strong>pr</strong>ojeção <strong>da</strong> linguagem em um espaçodespovoado por to<strong>da</strong>s as mitologias, o poema assume aforma <strong>da</strong> interrogação. Não é o homem que pergunta: alinguagem nos interroga (PAZ, 1990, p. 121. Grifo doautor).A <strong>poesia</strong> surge no silêncio e no balbuciamento, no não poder dizer, masaspira à recuperação <strong>da</strong> linguagem enquanto uma reali<strong>da</strong>de plena. O poetatransforma em palavra "tudo o que toca", sem omitir o silêncio e o <strong>br</strong>anco dotexto. O poema é um conjunto de signos que buscam um significado, umideograma que ain<strong>da</strong> não nasceu. Em sua rotação, o poema emite luzes que<strong>br</strong>ilham e se apagam de maneira sucessiva. O poema é a "busca do tu".No passado, a missão fun<strong>da</strong>mental do poeta talvez fosse a de "<strong>da</strong>r umsentido mais puro às palavras <strong>da</strong> tribo". Na atuali<strong>da</strong>de, sua missão é a de in<strong>da</strong>gar arespeito desse sentido. A in<strong>da</strong>gação do poeta não é uma dúvi<strong>da</strong>, mas uma busca,um ato de fé, pois sua palavra "não fun<strong>da</strong> ou estabelece na<strong>da</strong>, salvo suainterrogação".64
<strong>Helena</strong> <strong>Kolody</strong>: a <strong>poesia</strong> <strong>da</strong> <strong>inquietação</strong>A crítica de Octavio Paz é uma crítica <strong>da</strong> linguagem, mais ain<strong>da</strong>, dohomem e <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de. O homem, ao interrogar-se, busca a com<strong>pr</strong>eensão de suaessência e de seu destino. Pode-se dizer que esse questionar-se, in<strong>da</strong>gar-se dohomem, a<strong>pr</strong>esenta-se como uma <strong>inquietação</strong> humana.Em Convergências: ensaios so<strong>br</strong>e arte e literatura, Paz declara que"interrogar a linguagem é interrogar-nos a nós mesmos". Na história <strong>da</strong> <strong>poesia</strong>moderna aparece, como obsessão, a busca de uma linguagem anterior a to<strong>da</strong>s aslinguagens, visando restaurar e restabelecer a uni<strong>da</strong>de do espírito. Essa busca deuma linguagem transcendente a to<strong>da</strong>s as linguagens é uma <strong>da</strong>s formas desolucionar os antagonismos "entre a uni<strong>da</strong>de e a multiplici<strong>da</strong>de que não cessa deintrigar o espírito humano" (PAZ, 1991, p. 18).Em sua origem, a <strong>poesia</strong> foi fala<strong>da</strong> e ouvi<strong>da</strong> por uma coletivi<strong>da</strong>de. Poucoa pouco ela se tornou uma experiência solitária, um "tecido de conotações", feitade ecos, reflexos e correspondências, entre o som e o sentido. O poeta, ao nomearo que sentiu e pensou, não transmite as sensações e ideias originais, masa<strong>pr</strong>esenta formas e figuras que são combinações rítmicas nas quais o som éinseparável do sentido. O poema é a metáfora do que o poeta sentiu e pensou.Essa metáfora é a ressurreição <strong>da</strong> experiência e sua transmutação.Em relação à o<strong>br</strong>a de arte, salienta-se que ela é uma "transgressão <strong>da</strong>funcionali<strong>da</strong>de". O conjunto dessas transgressões constitui o estilo: os estilos são"comunais". Ca<strong>da</strong> o<strong>br</strong>a de arte é um "desvio e uma configuração do estilo de seutempo e lugar: ao violá-lo, cum<strong>pr</strong>e-o". A o<strong>br</strong>a de arte enquanto objeto é "eterna"(ain<strong>da</strong> que o seu destino seja a eterni<strong>da</strong>de refrigera<strong>da</strong> do museu). No entanto,como ideia, as o<strong>br</strong>as de arte "envelhecem e morrem". Porém, não raro, os artistas,os poetas esquecem que "sua o<strong>br</strong>a é dona do segredo do ver<strong>da</strong>deiro tempo: não aeterni<strong>da</strong>de vazia, mas a vivaci<strong>da</strong>de do instante" (PAZ, 1991, p. 57).Em La otra voz, Octavio Paz refere-se que a <strong>poesia</strong> é pedra de escân<strong>da</strong>lo<strong>da</strong> moderni<strong>da</strong>de. "Entre a revolução e a religião, a <strong>poesia</strong> é a outra voz. Sua voz éoutra porque é a voz <strong>da</strong>s paixões e <strong>da</strong>s visões. É de um outro mundo e é deste. Éantiga e atual, uma antigui<strong>da</strong>de sem <strong>da</strong>tas. Poesia herética e cismática, <strong>poesia</strong>inocente e perversa, límpi<strong>da</strong> e lodosa, aérea e subterrânea, <strong>poesia</strong> <strong>da</strong> ermi<strong>da</strong> e dobar <strong>da</strong> esquina, <strong>poesia</strong> ao alcance <strong>da</strong>s mãos e sem<strong>pr</strong>e de um mais além que estáaqui mesmo" (1990, p. 61).A singulari<strong>da</strong>de <strong>da</strong> <strong>poesia</strong> moderna não nasce <strong>da</strong>s ideias ou <strong>da</strong>s atitudesdo poeta, mas de sua voz, ou seja, do acento de sua voz. A <strong>poesia</strong> se ouve com osouvidos, porém se vê com o entendimento. Suas imagens são criaturas anfíbias,são ideias e são formas, são sons e silêncios. A <strong>poesia</strong> é a memória feito imagem e65
- Page 2 and 3:
ANTONIO DONIZETI DA CRUZé professo
- Page 4 and 5:
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO P
- Page 6 and 7:
© 2010, Antonio Donizeti da CruzRe
- Page 9:
AGRADECIMENTOS SEMPREAgradeço ao p
- Page 15: A alegria maior da vida é colher o
- Page 19: SIGLAS DOS LIVROS DE HELENA KOLODYP
- Page 23 and 24: PALAVRAS PRIMEIRASHelena Kolody: a
- Page 25 and 26: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 27 and 28: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 29 and 30: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 31 and 32: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 33 and 34: desenvolvimento da cultura brasilei
- Page 35 and 36: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 37 and 38: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 39 and 40: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 41 and 42: Feita de tortura e fel.Helena Kolod
- Page 43 and 44: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 45 and 46: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 47 and 48: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 49 and 50: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 51 and 52: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 53 and 54: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 55: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 58 and 59: Antonio Donizeti da CruzA única ju
- Page 60 and 61: Antonio Donizeti da Cruzpois, dessa
- Page 62 and 63: Antonio Donizeti da CruzJakobson co
- Page 64 and 65: Antonio Donizeti da Cruz"encantamen
- Page 68 and 69: Antonio Donizeti da Cruza imagem co
- Page 71 and 72: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 73 and 74: A comunicabilidade na poesia kolody
- Page 75 and 76: Em “Inquietação”, o sujeito l
- Page 77 and 78: “Exílio” (SR, p. 12) é um exe
- Page 79 and 80: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 81 and 82: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 83 and 84: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 85 and 86: Chego a pensar, às vezes, comovida
- Page 87 and 88: significado das palavras, além do
- Page 89 and 90: A poesia de Helena Kolody funda-se
- Page 91 and 92: O poema enquanto presente original
- Page 93 and 94: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 95 and 96: poético. Percebe-se que a linguage
- Page 97 and 98: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 99 and 100: A tanka “Sabedoria” (RE, p. 60)
- Page 101 and 102: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 103 and 104: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 105 and 106: O haicai intitulado “Depois” (R
- Page 107 and 108: Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 109 and 110: Pode-se dizer que a "semente" é me
- Page 111 and 112: A longa mão feita de sombraE tira
- Page 113 and 114: Ao calor do interrogar-senuvens ocu
- Page 115 and 116: dando um tom de irregularidade às
- Page 117 and 118:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 119 and 120:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 121 and 122:
Lembra, sem o querer, numa impress
- Page 123 and 124:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 125 and 126:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 127 and 128:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 129 and 130:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 131 and 132:
CONSIDERAÇÕES FINAISHelena Kolody
- Page 133 and 134:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 135 and 136:
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASHelena
- Page 137 and 138:
ATEM, Reinoldo. Panorama da poesia
- Page 139 and 140:
Helena Kolody: a poesia da inquieta
- Page 141 and 142:
JAKOBSON, Roman; POMORSKA, Kristyna
- Page 143:
ANEXOS
- Page 147:
145
- Page 151:
149
- Page 155:
153
- Page 159:
157
- Page 163:
161
- Page 167 and 168:
2PRAÇA RUI BARBOSAQuando a conheci
- Page 169:
3A PRAÇAQuando a conheci, chamava-
- Page 173:
HAIGO171
- Page 177:
175
- Page 181:
179
- Page 185 and 186:
MANEIRAS DE SERHelena KolodyOs que