Marta <strong>de</strong> Oliveira“Só a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é revolucionária e eu não posso trair esse princípio. Entãoquando me perguntaram se sabia eu menti? Também não é bem. Perguntaram.Cortei. Portanto, sem saber a pergunta não posso <strong>da</strong>r a resposta, ouseja, a resposta ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira”.(p. 41)A “maquinali<strong>da</strong><strong>de</strong>” dos gestos, a inópia do discurso, a reprodução <strong>de</strong>uma rotina e as atitu<strong>de</strong>s parodiam este ser caricaturado pela “palma <strong>da</strong>mão” do autor.Contrariamente a Feijó, surge um outro tipo <strong>de</strong> personagem, Adérito,“o personagem típico <strong>de</strong>sta socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, o ambicioso que tem uma formaçãouniversitária, todo o projecto <strong>de</strong>le, além <strong>de</strong> uma certa alienaçãoao mundo europeu, é um projecto <strong>de</strong> tomar o lugar do chefe, etc. Mascom to<strong>da</strong> essa formação que ele tem, quando vai ficar, interinamente,a substituir o chefe, ele faz uma volta à sua personali<strong>da</strong><strong>de</strong> e quer é ficarcom os fetiches que simbolizam o po<strong>de</strong>r: o carro, a secretária, as fotografias...,porque, sem isso, está convencido <strong>de</strong> que não vai po<strong>de</strong>r funcionar.Portanto, <strong>de</strong>ixou logo cair todo o seu saber académico, europeu, parautilizar outro tipo <strong>de</strong> premissas – transitórias, numa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> comoesta – mas que ele preten<strong>de</strong> aga<strong>rra</strong>r para trepar. Sim, esse personagemnão está torcido – está <strong>de</strong> roupa lava<strong>da</strong> e tal –, mas o perfil não está atracejado, está a traço grosso” (Laban: 1991:735-736).Será ain<strong>da</strong> através <strong>de</strong>ste que o autor expõe a etimologia e “dialécticado mujimbo”:82“Mujimbo é uma palavra cokwé que significa mensagem (...) A nossamalta <strong>da</strong> primeira gue<strong>rra</strong> <strong>da</strong> libertação, na frente leste, principalmente opessoal <strong>de</strong> origem urbana, <strong>de</strong>slumbrou-se com o vocábulo. Mujimbo passoua ser notícia. Um camara<strong>da</strong> ia <strong>de</strong> uma base a outra e, mal chegava,chovia a pergunta: quais os mujimbos que você traz? Ele na<strong>rra</strong>va. E passavammensagens, notícias, intrigas, tudo(...). A palavra foi-se <strong>de</strong>turpandoaté que mujimbo passou a coincidir com a novi<strong>da</strong><strong>de</strong> ain<strong>da</strong> não oficial ouaté o boato.(...) O povo em geral tem que an<strong>da</strong>r no passa palavra. No fundo é ocontinuar dos mecanismos <strong>de</strong> tradição oral. Auto-<strong>de</strong>fesa, porque não estarinformado é quase morrer. E é bem bonita a forma como se põe o mujimboa circular, os elos, a ca<strong>de</strong>ia do circuito. E, por <strong>de</strong>trás, sempre uma espécie <strong>de</strong>E-book CEAUP 2007
<strong>Na</strong>(<strong>rra</strong>)ção satírica e humorística: uma <strong>leitura</strong> <strong>da</strong> <strong>obra</strong> na<strong>rra</strong>tiva <strong>de</strong> Manuel Ruisentimento colectivo. E a gaita é que os mujimbos vão quase sempre <strong>da</strong>r àver<strong>da</strong><strong>de</strong> (...).Ca<strong>da</strong> sujeito receptor do mujimbo enten<strong>de</strong>-o primeiro como um quase<strong>de</strong>terminismo, vai mesmo acontecer! Essa é a primeira fase (...) <strong>Na</strong> segun<strong>da</strong>fase <strong>da</strong> dialéctica do mujimbo, a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> do sujeito receptor assume-oa partir <strong>de</strong> tal <strong>de</strong>terminismo. Então passa a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os conteúdos veiculadospelo mujimbo. (...) a melhor gue<strong>rra</strong> contra o mujimbo é forjar outromujimbo(...).(...) A <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> altura é uma exigência. Porque é uma necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>.Há já uma consciência social”.(pp. 100-102)<strong>Na</strong> trama ficcional, a semântica do segredo, conhecedor <strong>de</strong> diferentesterminologias e atributos: “secreto”, “sigilo”, “confi<strong>de</strong>ncial” (Feijó);“disso”, “<strong>da</strong>quilo” (204) (sobrinho <strong>de</strong> Feijó); “novi<strong>da</strong><strong>de</strong>”, “algo que aconteceumesmo” (Joaninha); “aquilo que eu li nos jornais” (Kitas); “gran<strong>de</strong>mujimbo” (Kino); “aquilo”, “isso” (operador do bê-bê-xis); “mujimbo”(Leninegrado); “segredo orgásmico”, “dialéctico” (Adérito); “trampado segredo” (Lun<strong>da</strong>mo) assumido como segredo, termina <strong>de</strong>sta forma(nunca, leitores, saberemos <strong>de</strong> que segredo se trata!). Confirma-se,assim, a contradição contrariando-a:“Contradição? Nem mais, na contradição é que se anuncia a síntese”.(p. 56)Adérito aponta a semântica do segredo como circular. O discursoserá resumido, assim, pelo seu interlocutor, Lun<strong>da</strong>mo:“Pela tua equação elabora-se um círculo on<strong>de</strong> todos sabem, mas ninguémdiz a ninguém e uns já disseram aos outros. Absurdo”.(p. 34)83Ao que Adérito retorque:“Absurdo não Dialético. Repara: saber e não saber porque se sabe”.(p. 34)204Os vocábulos utilizados (“isto”; “isso”; “aquilo”...) transmitem o distanciamento do sujeito enunciador.2007 E-BOOK CEAUP
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