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A RELÍQUIA

Untitled - Luso Livros

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Fugi, aturdido e confuso. O sábio historiador dos Herodes passeava no adro,sob o seu guarda-chuva, respirando o ar húmido. De novo nos acometeu obando esfaimado dos vendilhões de relíquias. Repeli-os rudemente; e saí dosanto lugar como entrara — em pecado e praguejando.No hotel, Topsius recolheu logo ao quarto a registar as suas impressões dosepulcro de Jesus; eu fiquei no pátio cervejando e cachimbando com oaprazível Pote. Quando subi, tarde, o meu esclarecido amigo já ressonava,com a vela acesa — e com um livro aberto sobre o leito, um livro meu,trazido de Lisboa para me recrear no país do Evangelho, o Homem dos TrêsCalções. Descalçando os botins, sujos da lama venerável da Via-Dolorosa —eu pensava na minha Cibele. Em que sacratíssimas ruínas, sob que árvoresdivinizadas por terem dado sombra ao Senhor, passara ela essa tarde nevoentade Jerusalém? Fora ao Vale do Cédron? Fora ao branco túmulo de Raquel?...Suspirei, amoroso e moído; e abria os lençóis bocejando — quandodistintamente, através do tabique fino, senti um ruído de água despejada numabanheira. Escutei, alvoroçado; e logo nesse silêncio negro e magoado quesempre envolve Jerusalém, me chegou, percetível, o som leve de uma esponjaarremessada na água. Corri, colei a face contra o papel de ramagens azuis.Passos brandos e nus pisavam a esteira que recobria o ladrilho de tijolo; e aágua rumorejou, como agitada por um doce braço despido que lheexperimentava o calor. Então, abrasado, fui ouvindo todos os rumoresíntimos de um longo, lento, lânguido banho; o espremer da esponja; o fofo

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