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A RELÍQUIA

Untitled - Luso Livros

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lampejou no ar; e o bando recuou blasfemando — em quanto algunsembrulhavam na ponta do salão os dedos que escorriam sangue.Nós acercamo-nos de José de Ramata. Mas o sombrio homem abaloubruscamente, esquivando a importunidade do sábio Topsius. E, magoadoscom a sua rudeza, ali ficamos junto de um tronco de oliveira seca, em frentedas outras cruzes.Os dois condenados tinham acordado do primeiro desmaio, sob a frescura daaragem da tarde. Um, grosso, peludo, com os olhos esbugalhados, o peitoatirado para diante e as costelas a estalar, como se num esforço desesperadoquisesse arrancar-se do madeiro — urrava sem descontinuar, medonhamente;o sangue pingava-lhe em gotas lentas dos pés negros, das mãos esgarçadas; eabandonado, sem afeição ou piedade que o assistissem, era como um loboferido que uiva e morre num brejo. O outro, delgado e louro, pendia sem umgemido, como uma haste de planta meio quebrada. em frente dele umamulher, macilenta e em farrapos, passando a cada instante o joelho sobre acorda, estendia-lhe nos braços uma criancinha nua, e gritava, já rouca: "Olhaainda, olha ainda!" As pálpebras lívidas não se moviam; um negro, queentrouxava as ferramentas da crucificação, ia empurrá-la com brandura; elaemudecia, apertava desesperadamente o filho para que lho não levassemtambém, batendo os dentes, tremendo toda; e a criancinha entre os farraposprocurava o seio magro.

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