para uma leitura não-biográfica da obra de mário de sá-carneiro
para uma leitura não-biográfica da obra de mário de sá-carneiro
para uma leitura não-biográfica da obra de mário de sá-carneiro
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
251 polissema 7 2007<br />
com as opções do tradutor em questão, até pela razão bastante simples que aqui<br />
a língua <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> se encontra estrutura<strong>da</strong> linguística, formal e funcionalmente <strong>de</strong> tal<br />
modo que se insere num sistema literário e poético por direito próprio. A<br />
consequência primeira <strong>de</strong>sta característica do texto original é a <strong>de</strong> permitir<br />
interpretações várias e mesmo divergentes que resultarão em soluções obviamente<br />
diferentes <strong>de</strong> acordo com os aspectos que ca<strong>da</strong> tradutor consi<strong>de</strong>re dignos <strong>de</strong> realce ou<br />
menos <strong>de</strong>terminantes <strong>para</strong> a função a que o texto se <strong>de</strong>stina.<br />
Em termos concretos, as minhas opções diferem <strong>da</strong>s verbaliza<strong>da</strong>s pela<br />
tradução C sobretudo em termos lexicais e gramaticais, sendo que seleccionaría <strong>para</strong> o<br />
último verso <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> quadra Que mão ousou controlar o fogo, em vez <strong>de</strong> Com que<br />
mãos agarra o fogo, porque a singularização do substantivo no original é<br />
<strong>de</strong>terminante <strong>para</strong> a caracterização vela<strong>da</strong> <strong>da</strong> personagem divina que é respon<strong>sá</strong>vel<br />
pela criação do tigre. O mesmo se aplica ao primeiro verso <strong>da</strong> quarta estrofe, on<strong>de</strong> a<br />
utilização do artigo <strong>de</strong>finido antes <strong>de</strong> martelo é mais um elemento precioso <strong>para</strong> tal<br />
i<strong>de</strong>ntificação, que é feita segundo subterfúgios e breves alusões, que contribuem <strong>de</strong><br />
forma inequívoca <strong>para</strong> a beleza do poema. Gostaría ain<strong>da</strong> <strong>de</strong> sugerir a total alteração<br />
<strong>da</strong> quinta quadra <strong>para</strong><br />
Quando as estrelas as suas lanças largaram<br />
E com suas lágrimas o céu banharam<br />
Será que ao ver o seu trabalho Ele sorri?<br />
Aquele que fez o Cor<strong>de</strong>iro fez-te a ti?<br />
Apesar <strong>de</strong> ter sido possível manter-me fiel à rima que <strong>de</strong>sempenha um papel tão<br />
vital, <strong>não</strong> fiquei totalmente satisfeita com a esta solução porque tive que alterar o<br />
tempo verbal do terceiro verso <strong>para</strong> o presente do indicativo, quebrando <strong>de</strong>sse modo a<br />
harmonia morfológica instituí<strong>da</strong> pelo poema <strong>de</strong> William Blake.<br />
O facto <strong>da</strong>s inhas sugestões serem em número tão reduzido po<strong>de</strong> ser explicado <strong>não</strong> só<br />
pela dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> extrema <strong>de</strong> encontrar outras respostas que solucionassem mais a<br />
contento alguns problemas <strong>de</strong> significação e, ao mesmo tempo, que <strong>não</strong> <strong>de</strong>struíssem a<br />
harmonia rítmica e a economia global do texto, mas também e sobretudo porque o<br />
trabalho <strong>de</strong> António Simões consegue transmitir o significado latente do poema, <strong>não</strong><br />
impedindo interpretações segun<strong>da</strong>s por escolha <strong>de</strong>masiado limita<strong>da</strong> no espectro<br />
lexical <strong>da</strong> língua <strong>de</strong> chega<strong>da</strong>. A sua tradução opera transferências valorativas ao nível