10.05.2013 Views

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

a confrontação do habitus — se o objetivo da cultura for a ampliação da<br />

esfera de presença do ser; mas é impensável que possa ser outra coisa,<br />

como a insistência na perseverança do ser, que não precisa de nada<br />

nem de ninguém para cuidar de si mesma, inclusive nestes tempos<br />

chamados de globalização: para a perseverança do ser não se requer<br />

uma política cultural, não na medida em que ainda hoje se imagina que<br />

isso seja — só pode ser feita pela cultura, com as obras de cultura. Por<br />

certo, mesmo as obras de cultura não são imunes à ação do habitus,<br />

pelo menos do habitus próprio a seu território específico; no entanto, a<br />

capacidade e a disposição que têm (quando comparadas ao habitus;<br />

quando comparadas à arte, é outra história, como se verá) para reveremse<br />

a si mesmas e contestarem por dentro o sistema a que pertencem,<br />

embora por disposição contratual e pelo menos desde a modernidade,<br />

coloca-as como o recurso decisivo (depois da arte) para a necessária<br />

confrontação do habitus. É evidente que, como a cultura é um processo<br />

e não um estado, aquilo que num determinado momento histórico é<br />

cultura, em outro pode transformar-se em habitus, a ser confrontado<br />

por nova proposição cultural. Este encaminhamento da discussão leva<br />

a que se acrescente agora uma pequena precisão à ideia inicial de que<br />

toda ação cultural, como instrumento de uma política cultural, trata de<br />

criar as condições para que as pessoas inventem seus fins. O acréscimo<br />

diz respeito à necessidade de criarem-se as condições para que se<br />

inventem fins capazes de permitir a ampliação da esfera de presença<br />

do ser, não que conduzam à estagnação desse ser. Cabe aos que forem<br />

servidos por essa política a tarefa de inventarem-se os meios e os fins<br />

orientados por esse objetivo. Esse poderia ser um princípio da ética da<br />

política cultural, do lado dos que a formulam e implementam e do lado<br />

dos que são por ela servidos.<br />

O papel negativo que o habitus representa no processo cultural<br />

mais amplo (papel que no esquema de Bourdieu não será tão negativo<br />

quanto aqui se desenha mas que mesmo assim é suficientemente<br />

específico para ser posto em destaque e em comparação com o papel<br />

das obras culturais) pode ser diminuído ou relativizado se o prisma a<br />

adotar na reflexão sobre a cultura for o da linhagem interacionista de<br />

Edward Sapir (1884-1939) 11 . Para o interacionismo de Sapir, “o verdadeiro<br />

lugar da cultura são as interações individuais”. A cultura não estaria<br />

num lugar específico — nas obras de cultura ou no comportamento e<br />

nas formas de lazer — mas num jogo que não se detém. Seu<br />

entendimento da cultura não é substancialista (não há uma essência<br />

da cultura localizável a priori; e assim como ocorre nas artes plásticas<br />

11 Anthropologie. Paris: Minuit, 1967 (edição original norte-americana de 1949).<br />

NEM TUDO É <strong>CULTURA</strong> 33<br />

A <strong>CULTURA</strong><br />

COMO<br />

INTERAÇÃO

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!