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A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

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<strong>CULTURA</strong> E<br />

CRÍTICA<br />

COM SUTILEZA<br />

E PRESTEZA<br />

como se dizia, o cultivo do espírito, tornou-se limitado se não se<br />

apresentar com algum qualificativo adicional. Para que algo seja<br />

realmente cultural, o senso crítico deve ter, nisso, uma presença marcante.<br />

A cultura surge outra vez, então, como sendo de fato a lâmina do arado.<br />

A cultura não é mais o campo que o homem prepara e do qual extrai<br />

uma série de produtos; não é nem o arado que trabalha esse campo,<br />

não é nem mesmo o conjunto dessas coisas todas mas é<br />

preferencialmente a lâmina afiada que penetra nesse campo e o corta e<br />

revolve, pondo para cima o que estava embaixo e vice-versa. Ampliar a<br />

esfera de presença do ser não é, em si, tudo, não basta ou, melhor, não<br />

é algo que se consiga apenas com o ver mais, ver outra coisa, ver muito.<br />

Ampliar essa esfera de presença do ser é algo que só se consegue com<br />

a capacidade de discernir de modo agudo, sutil e rápido entre uma coisa e<br />

outra, entre o que pode ampliar essa esfera e o que a amarra ao mesmo,<br />

entre o que pode impulsionar o ser na direção de seu desenvolvimento<br />

maior e aquilo que o atrasa, o faz regredir. A fonte dessa especificação<br />

é, outra vez, o próprio Montesquieu e sua <strong>def</strong>inição para o gosto. Ele o<br />

apresentava de fato como “a vantagem de descobrir com sutileza e<br />

presteza a medida do prazer que cada coisa deve dar aos homens”.<br />

Sutileza e presteza. Rapidez: algo tão mais necessário num mundo em<br />

que a proliferação e o acúmulo da informação supera em muito a<br />

capacidade média de recepção e reflexão sobre o que se recebe. Não se<br />

pede mais apenas a capacidade de reflexão, mas a reflexão que se pode<br />

exercer rapidamente. Uma capacidade veloz, por dizê-lo assim, e que<br />

além do mais deve ser exercida com sutileza: várias coisas podem hoje<br />

dar-me prazer e em princípio ampliar a esfera de presença de meu ser;<br />

preciso então distinguir com sutileza entre aquelas várias coisas que<br />

podem me levar até lá com mais proveito, mais intensidade. Que essa<br />

capacidade crítica deve permitir-me descobrir a medida do prazer que<br />

cada coisa pode proporcionar, é algo a ser bem destacado. Já se superou<br />

a primeira, e primária, visão religiosa, no entanto ainda ativa por toda<br />

parte, segundo a qual o prazer e a felicidade não são deste mundo e,<br />

portanto, o sacrifício e a dor devem ser vistos como inevitáveis e,<br />

mesmo, suportáveis e desejáveis em sua condição de instrumentos<br />

para apressar a passagem para o mundo real além. (O terrorismo de<br />

inspiração religiosa — que, claro, é muito mais que isso — é um exemplo<br />

nítido dessa crença, como se tornou bem claro depois do<br />

recrudescimento da intifada palestina, com seus homens (e agora<br />

mulheres e crianças)-bomba levando até Israel sua mensagem de<br />

inconformismo, e depois de setembro de 2001.) Já se superou também<br />

o primarismo de variados ideologismos de esquerda e direita segundo<br />

36 A <strong>CULTURA</strong> E <strong>SEU</strong> <strong>CONTRÁRIO</strong>

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